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Rosa da Rosa suspende representações contra Gurgel

CNMP não pode abrir procedimentos contra o procurador-geral da República.

Da Redação

quinta-feira, 30 de agosto de 2012

Atualizado às 09:02

Duas representações apresentadas ao CNMP pelo senador Fernando Collor (PTB/AL), questionando atos do procurador-geral da República, tiveram andamento suspenso por liminar proferida pela ministra Rosa Weber, do STF. Para a ministra, assim como o CNJ não tem competência sobre os ministros do STF, o CNMP não pode abrir procedimentos contra o procurador-geral da República.

As representações formuladas pelo senador dizem respeito à suposta "inércia ou excesso de prazo" na condução de investigações pelo procurador-geral da República, relativos ao recebimento do inquérito da denominada "Operação Vegas", realizada pela PF.

O procurador-geral impetrou no STF o MS 31.578, questionando ato do conselheiro do CNMP Almino Afonso Fernandes, que determinou o processamento das representações. Argumentou o procurador-geral sua não submissão ao controle exercido pelo CNMP.

Segundo a decisão proferida pela ministra Rosa Weber, o exame dos atos praticados pelo procurador-geral da República dentro de suas prerrogativas constitucionais não se insere nas competências do CNMP, citando decisão proferida pelo STF em ADIn, em que a Corte deixou expresso que o CNJ não tem nenhuma competência sobre o Supremo e seus ministros.

__________

MEDIDA CAUTELAR EM MANDADO DE SEGURANÇA 31.578 DISTRITO FEDERAL

RELATORA :MIN. ROSA WEBER

IMPTE.(S) :PROCURADOR-GERAL DA REPÚBLICA

IMPDO.(A/S) :CONSELHO NACIONAL DO MINISTÉRIO PÚBLICO

ADV.(A/S) :ADVOGADO-GERAL DA UNIÃO

Vistos etc.

Trata-se de mandado de segurança, com pedido de liminar, impetrado pelo Procurador-Geral da República contra ato praticado pelo Conselheiro Almino Afonso Fernandes, do Conselho Nacional do Ministério Público - CNMP, que determinou o processamento de duas representações formuladas pelo Senador Fernando Affonso Collor de Mello (nº 0.00.000.000600/2012-10 e nº 0.00.000.000603/2012-53), nas quais se atribuiu ao impetrante "inércia ou excesso de prazo no desempenho do munus ministerial quando do recebimento do Inquérito Policial Federal nº 042/2008 e da Medida Cautelar de Interceptação Telefônica nº 2008.35.00000871-4" (fl. 3).

Os processos mencionados referem-se à denominada 'Operação Vegas' da Polícia Federal, e vieram à Procuradoria Geral da República diante de indícios do envolvimento de autoridades com prerrogativa de foro no Supremo Tribunal Federal. Segundo as representações formuladas pelo Senador, tanto o impetrante quanto a Subprocuradora- Geral da República Cláudia Sampaio Marques "teriam permanecido inertes quanto ao dever de investigar, permitindo que os delitos atribuídos ao grupo chefiado por Carlos Augusto de Almeida Ramos, conhecido como Cachoeira, continuassem a ser praticados, além de afirmar que a execução de tais delitos somente não continuou exitosa em razão da atuação do Ministério Público Federal no Estado de Goiás, nos autos do Inquérito Policial nº 89/2011, na investigação denominada Operação Monte Carlo" (fls. 3-4).

Recebidas as representações, o impetrante foi notificado e apresentou informações, arguindo sua não submissão ao controle exercido pelo Conselho Nacional do Ministério Público e juntando cópia das razões anteriormente encaminhadas à 'CPMI Vegas e Monte Carlo'.

Em 27.7.2012, o Conselheiro Almino Afonso Fernandes proferiu decisões onde, em resumo, (i) afastou a incidência de precedentes monocráticos do próprio Conselho Nacional do Ministério Público que haviam reconhecido a impossibilidade de submeter a exame daquele órgão os atos praticados pelo Procurador-Geral da República, porque "no presente procedimento preliminar não se busca atribuir responsabilidades (...), mas tão somente verificar as alegações fáticas constantes da representação" (fl. 5), julgando adequado postergar para "momento oportuno, mediante deliberação do Plenário", a questão da competência; (ii) destacou a existência de outra autoridade no polo passivo das representações que não estaria sujeita ao regramento especial destinado ao Procurador-Geral da República; e (iii) considerou inadequado abortar os procedimentos com base no Enunciado nº 6 do CNMP, porque tal questão se confundiria com o mérito. Tal Enunciado está assim redigido:

"Os atos relativos à atividade fim do Ministério Público são insuscetíveis de revisão ou desconstituição pelo Conselho Nacional do Ministério Público. Os atos praticados em sede de inquérito civil público, procedimento preparatório ou procedimento administrativo investigatório dizem respeito à atividade finalística, não podendo ser revistos ou desconstituídos pelo Conselho Nacional do Ministério Público, pois, embora possuam natureza administrativa, não se confundem com aqueles referidos no art. 130-A, § 2º, inciso II, CF, os quais se referem à gestão administrativa e financeira da Instituição".

A autoridade coatora determinou, por fim, a intimação dos Procuradores da República no Estado de Goiás que oficiam nas investigações relacionadas a 'Carlinhos Cachoeira' para oitiva a respeito dos fatos mencionados nas representações, em data a ser definida.

O impetrante sustenta que "os procedimentos em causa têm por objeto apenas e tão somente ato ou atos do Procurador-Geral da República", apesar da inclusão da Subprocuradora-Geral da República Claudia Sampaio Marques nos requerimentos oferecidos pelo Senador Fernando Collor, pois é ele "o único e exclusivo responsável pela atuação do Ministério Público nos feitos de competência do Plenário do Supremo Tribunal Federal" (fl. 7), nos termos dos arts. 46, 47 e 66, § 1º, da LC 75/93; nos processos do Pleno do STF, "os Subprocuradores-Gerais da República que eventualmente ali oficiam o fazem não apenas por delegação do Procurador-Geral da República mas sob o APROVO" deste (fl. 8). Além disso, especificamente no que se refere aos autos relacionados à Operação Vegas, "não houve sequer distribuição a qualquer Subprocurador-Geral da República (...), permanecendo ambos os feitos vinculados diretamente ao Procurador-Geral da República e sob a sua completa e exclusiva responsabilidade" (fls. 8/9).

Defende, também, que "assim como os Ministros do Supremo Tribunal Federal, o Procurador-Geral da República responde por seus atos perante o Senado Federal (art. 52, II, da Constituição da República" (fl. 10), decorrendo de uma "vetusta tradição jurídica" (fl. 11) a equiparação de 'status' e de prerrogativas entre aquelas autoridades.

Aplicável por similitude, portanto, o entendimento firmado na ADI 3.367, Min. Cezar Peluso, DJ de 22.9.2006, quando estabelecido que os Ministros do Supremo Tribunal Federal não estão sujeitos ao controle do Conselho Nacional de Justiça, salientando-se ainda que o CNJ é presidido pelo Presidente do Supremo Tribunal Federal (art. 103-B, I e § 1º, da CF) e o CNMP, pelo próprio Procurador-Geral da República (art. 130-A, I, da CF).

Em resumo, portanto, haveria "uma limitação ratione personae da atuação do Conselho Nacional do Ministério Público em relação aos atos do Procurador-Geral da República", pois "além de não poder interferir na sua atividade finalística, porque membro do Ministério Público, também não detém o colegiado atribuição para o controle disciplinar, financeiro e administrativo a ele atinente" (fl. 14).

O fumus boni iuris necessário à concessão do pedido liminar estaria consubstanciado nas razões expostas, e o periculum in mora, na determinação de "diligências nos autos das representações, dando-se prosseguimento ao exame da atuação do Procurador-Geral da República, não obstante a absoluta incompetência do órgão de controle externo para tanto" (fl. 17). Requer-se, portanto, a imediata suspensão da tramitação dos procedimentos CNMP nº 0.00.000.000600/2012-10 e 0.00.000.000603/2012-53; e, no mérito, a concessão da ordem para "determinar a extinção dos procedimentos acima indicados, diante da impossibilidade de serem os atos do Procurador-Geral da República submetidos ao controle do Conselho Nacional do Ministério Público" (fl. 18).

É o relatório.

Decido.

Neste juízo perfunctório que é próprio do exame dos pedidos liminares, entendo ser fundada a argumentação trazida pela inicial no sentido de que o exame dos atos praticados pelo Procurador-Geral da República dentro de suas prerrogativas constitucionais não se insere nas competências do Conselho Nacional do Ministério Público.

Quando julgada a ADI 3.367-1/DF, Min. Cezar Peluso, DJ de 22.9.2006, o STF deixou expresso que "O Conselho Nacional de Justiça não tem nenhuma competência sobre o Supremo Tribunal Federal e seus ministros, sendo esse o órgão máximo do Poder Judiciário nacional". O Conselheiro Relator das decisões impugnadas manifestou posição pessoal no sentido de que esse tema deveria ser debatido futuramente pelo Pleno do CNMP, mas está comprovado nos autos que a extensão de tal entendimento às relações entre Procurador-Geral da República e Conselho Nacional do Ministério Público não é estranha à jurisprudência do próprio órgão, conforme transcrição de decisões proferidas pelo Corregedor Nacional Osmar Machado Fernandes na Reclamação Disciplinar nº 807/2008-16 e pelo Conselheiro Sérgio Feltrin Corrêa na Representação por Excesso de Prazo nº 377/2010-49 (fls. 163-5).

A tese trazida na inicial - e referendada por decisões do CNMP - é sustentada pelo fato de que, nos termos dos artigos 128, §§ 1º e 2º da CF e 25, 'caput' e parágrafo único da LC 75/93, o Procurador-Geral da República é o chefe do Ministério Público da União, e tanto sua nomeação, como a recondução e a exoneração dependem de decisão do Presidente da República, com autorização do Senado Federal. Além disso, em razão da importância e dignidade do cargo de Procurador-Geral da República, existem previsões constitucionais específicas a respeito da imputação de determinados tipos de conduta ao seu ocupante, como a previsão (no art. 52, II) de competência privativa do Senado Federal para o processo e julgamento nos crimes de responsabilidade (cuja competência, aliás, abarca também todos os demais Conselheiros do CNMP), e de competência originária do Supremo Tribunal (art. 102, I, 'b') para os crimes comuns.

Ademais, também por expressa determinação constitucional, o Procurador-Geral da República é o Presidente do Conselho Nacional do Ministério Público (art. 130-A, I), e, ao mesmo tempo, ainda representa a Instituição do Ministério Público (art. 26, I, da LC 75/93). E, por fim, apenas a ele incumbe 'exercer as funções do Ministério Público junto ao Supremo Tribunal Federal' e, nesta Corte, propor 'as ações cíveis e penais cabíveis' (art. 46, parágrafo único, III, da LC 75/93), no que estão incluídas, evidentemente, as providências referentes a Inquérito que envolva pessoa com foro de prerrogativa de função (art. 231, § 1º, do RISTF).

Em resumo, (i) a concentração de tamanho feixe de atribuições e competências exclusivas na figura do Procurador-Geral da República, (ii) a proeminência funcional do cargo dentro da estrutura do Ministério Público Federal e a existência, em contrapartida, de (iii) uma delimitação fechada de competências ao CNMP pelo art. 130-A, § 2º, da CF são todos elementos indicativos de que existe forte consistência na argumentação trazida pela inicial, no sentido de que o entendimento firmado pelo STF a respeito da 'preeminência' desta Corte em face do Conselho Nacional de Justiça (termo expressamente usado pela ementa da ADI 3.367-1, já citada) pode ser aplicado por simetria também à presente hipótese.

Adicionalmente - e apesar da suficiência de tais razões para o deferimento do pleito liminar - é possível destacar, ainda, que as duas representações impugnadas neste mandado de segurança foram apresentadas sob a forma de 'representações por inércia ou por excesso de prazo', cuja previsão no Capítulo III do Título V do Regimento Interno do Conselho Nacional do Ministério Público estipula âmbito bastante restrito de análise, verbis:

CAPÍTULO III

DA REPRESENTAÇÃO POR INÉRCIA OU POR EXCESSO DE PRAZO

Art. 87 A representação contra membro do Ministério Público por inércia ou excesso injustificado de prazo na realização de atos processuais ou administrativos poderá ser formulada por qualquer interessado ou Conselheiro.

§ 1º A representação será apresentada por petição instruída com os documentos necessários à sua comprovação e distribuída a um Relator.

§ 2º Não sendo o caso de indeferimento sumário, o Relator notificará previamente o representado, encaminhando-lhe cópia da representação e dos documentos que a instruem, facultandolhe o prazo de quinze dias para que preste as informações que entender cabíveis.

§ 3º Se houver prova pré-constituída do fato e o caso exigir providência urgente, o Relator poderá fixar desde logo prazo para que a irregularidade seja sanada.

§ 4º Decorrido o prazo do § 2º deste artigo com ou sem as informações, o Relator, se entender não ser o caso de extinção por perda de objeto, pedirá a inclusão do feito em pauta, a fim de que o Plenário decida sobre a necessidade de instauração de processo administrativo disciplinar.

§ 5º As disposições deste artigo são aplicáveis, no que couber, ao pedido de representação por excesso de prazo apresentado contra servidor do Ministério Público.

À luz do Regimento Interno do CNMP a função da representação em questão é, primordialmente, a de solucionar um alegado atraso que está a ocorrer no momento da interposição do pedido - atraso atual, portanto - prevendo-se inclusive a estipulação de prazo para correção da irregularidade (art. 87, § 3º).

Tal providência, entendo, é incabível na hipótese, porque o atraso que se discute é pretérito; na verdade, não se discute sequer o atraso propriamente dito, mas certas imputações ou juízos de valor formulados pelo autor das representações, a partir daquele fato. Aparentemente, portanto, não se vislumbra medida útil (dentre as que estão naturalmente vinculadas à via eleita) que poderia advir de tais representações.

Nesse sentido, destaque-se o comando do Conselheiro Relator para que os Procuradores da República vinculados às investigações no Estado de Goiás "compareçam perante este Conselho em dia e hora, a serem designados, observada a pauta de sessão deste Órgão, visando ser ouvidos sobre os fatos objeto de análise neste procedimento, especialmente sobre o liame existente entre as operações 'Vegas' e 'Monte Carlo' (fl. 123 - sem grifos no original), providência que não guarda, a rigor, pertinência com o rito do artigo 87 do RICNMP, supra citado.

Diante do exposto, e sem prejuízo de uma análise mais detida de todas as alegações quando do julgamento do mérito, defiro a medida liminar, para que seja suspenso o curso das representações nº 0.00.000.000600/2012-10 e nº 0.00.000.000603/2012-53, atualmente em trâmite perante o Conselho Nacional do Ministério Público.

Notifique-se a autoridade apontada como coatora para que preste informações no prazo de dez dias (art. 7º, I, da Lei 12.016/2009). Dê-se ciência à Advocacia-Geral da União (art. 7º, II, da Lei 12.016/2009).

Publique-se.

Intime-se.

Brasília, 23 de agosto de 2.012.

Ministra Rosa Weber

Relatora