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Telefonia

Mantido bloqueio de mais de R$ 100 mi da Oi

Objetivo é garantir devolução de ICMS aos consumidores.

Da Redação

segunda-feira, 18 de fevereiro de 2013

Atualizado às 08:22

A 1ª câmara de Direito Público do TJ/SC manteve, em decisão unânime, medida liminar obtida em ACP, que bloqueou depósitos judiciais de ICMS da Brasil Telecom. A liminar foi requerida com o objetivo de garantir a devolução do imposto aos consumidores, no valor de mais de R$ 100 milhões.

O depósito judicial dos valores relativos ao ICMS foi determinado em processo ajuizado pela Brasil Telecom em 1998. Na ação, a Brasil Telecom demonstrou que não deveria pagar ICMS ao Estado sobre os serviços de valor adicionado - como conexão à internet, serviços 0900 e 0300 e ringtones, entre outros.

Com decisão favorável à empresa, a ação transitou em julgado em 27/11/09. Porém, mesmo sem recolher o imposto, a Brasil Telecom continuou cobrando o valor do ICMS dos consumidores.

Em 2010, o MP/SC ajuizou a ACP, com pedido de liminar, para suspender a cobrança pela Brasil Telecom do ICMS sobre os chamados serviços denominados de "valor adicionado" e manter o bloqueio dos depósitos judiciais, até que o mérito da ACP seja julgado, decidindo se os valores pertencem aos consumidores ou à empresa.

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Agravo de Instrumento n. 2010.033522-7, da Capital

Relator: Des. Jorge Luiz de Borba

AÇÃO CIVIL PÚBLICA. ANTECIPAÇÃO DE TUTELA DESTINADA A SOBRESTAR O LEVANTAMENTO DE VALORES DEPOSITADOS JUDICIALMENTE EM PRÉVIA DEMANDA DECLARATÓRIA DE INEXISTÊNCIA DE OBRIGAÇÃO TRIBUTÁRIA AJUIZADA POR EMPRESA CONCESSIONÁRIA DE TELEFONIA. LEGITIMAÇÃO ATIVA AD CAUSAM DO MINISTÉRIO PÚBLICO INDISCUTÍVEL. ATITUDE DA FORNECEDORA APTA A HOMOGENEIZAR O INTERESSE DOS CONSUMIDORES NA ESPÉCIE.

"O pensamento moderno acerca da ação civil pública preconiza que este instrumento processual não se presta unicamente à defesa de interesses coletivos ou difusos, mas também de interesses individuais que se enquadram nas disposições do art. 127 da Constituição Federal. Noutros termos, a ação civil pública tem por escopo a defesa das garantias e dos direitos constitucionais que interessam à toda coletividade, mesmo que concernente à pessoa ou pessoas identificadas.

'Certos direitos individuais homogêneos podem ser classificados como interesses ou direitos coletivos, ou identificar-se com interesses sociais e individuais indisponíveis.

Nesses casos, a ação civil pública presta-se a defesa dos mesmos, legitimado o Ministério Público para a causa. C.F., art. 127, caput, e art. 129, III. III. [...]' (RE n. 195.056, Min. Carlos Velloso)" (AC n. 2009.040213-9, de Biguaçu, rel. Des. Luiz Cézar Medeiros, j. 6-4-2010).

NÃO INCIDÊNCIA DO ICMS SOBRE SERVIÇOS AUXILIARES RECONHECIDA EM SENTENÇA TRANSITADA EM JULGADO. TRIBUTO QUE, PORÉM, TEM O CONSUMIDOR POR CONTRIBUINTE DE FATO E QUE, PORTANTO, DEVE SER A ELE, E NÃO À CONCESSIONÁRIA, RESTITUÍDO. INAPLICABILIDADE DO ÓBICE DO ART. 1º, PARÁGRAFO ÚNICO, DA LEI N. 7.347/1985, E POSSIBILIDADE DE INCIDÊNCIA DO ART. 166 DO CTN. EXISTÊNCIA DE VEROSSIMILHANÇA BASTANTE PARA SOBRESTAR O PROPALADO LEVANTAMENTO. RECURSO A QUE SE NEGA PROVIMENTO.

Vistos, relatados e discutidos estes autos de Agravo de Instrumento n. 2010.033522-7, da comarca da Capital (1ª Vara da Fazenda Pública), em que é agravante Brasil Telecom S/A e agravado Ministério Público do Estado de Santa Catarina:

A Primeira Câmara de Direito Público decidiu, à unanimidade, conhecer do recurso e negar-lhe provimento. Custas legais.

O julgamento, realizado nesta data, foi presidido pelo Exmo. Sr. Des. Newton Trisotto, sem voto, e dele participaram o Exmo. Sr. Des. Gaspar Rubick e o Exmo. Sr. Des. Subst. Paulo Henrique Moritz Martins da Silva.

Florianópolis, 5 de fevereiro de 2013

Jorge Luiz de Borba

RELATOR

RELATÓRIO

Brasil Telecom S/A interpôs agravo de instrumento à decisão pela qual se concedeu a antecipação de tutela postulada pelo Ministério Público de Santa Catarina na ação civil pública que move em face da ora agravante. Relatou que as suas antecessoras, concessionárias do serviço público de telefonia, ajuizaram ação declaratória da inexistência de débito tributário em face do Estado de Santa Catarina, a qual foi autuada sob o n. 023.98.052120-6, almejando ser desobrigada do recolhimento do ICMS incidente sobre "serviços auxiliares".

Referiu que, já no âmbito da demanda cautelar preparatória, autorizou-se o depósito judicial dos valores correspondentes ao tributo, providência que foi por ela tomada ao longo de toda a tramitação do feito. O pleito formulado naquelas demandas, segundo a recorrente, foi julgado procedente em sentença que transitou em julgado ainda em novembro de 2009. O agravado, então, ingressara com a ação civil pública de origem pleiteando, em especial, a devolução em dobro dos valores cobrados indevidamente dos consumidores a título de ICMS e a reversão em prol dos consumidores, e não da concessionária, das quantias depositadas no curso das aludidas demandas.

Sustentou a necessidade de reforma da decisão recorrida, pela qual se sobrestou o levantamento dos montantes objeto de depósito, uma vez que o parquet seria parte ativa manifestamente ilegítima para a tutela de interesses individuais disponíveis, conforme se extrai dos arts. 3º e 267, VI do CPC; que a ação civil pública não seria instrumento adequado para veicular pretensões tributárias, na forma do parágrafo único do art. 1º da Lei n. 7.347/1985; e que o art. 166 do CTN não seria aplicável na hipótese de depósito judicial.

Pugnou, enfim, o provimento do reclamo para possibilitar o levantamento dos valores depositados nos referidos processos, bem como a antecipação dos efeitos da tutela recursal.

O Exmo. Sr. Des. Subst. Luiz Fernando Boller indeferiu a tutela recursal de urgência (fls. 159-165).

Opostos embargos de declaração a esse decisum (fls. 169-176), o referido magistrado os rejeitou e impôs ao embargante sanção equivalente a 1% ao valor da causa subjacente (fls. 177-184).

Ofertadas contrarrazões (fls. 188-224) pela agravada e interposto agravo regimental (fls. 225-237) pela Brasil Telecom S/A, a este último recurso a Câmara Civil Especial negou provimento em acórdão (fls. 241-257) que foi objeto de recurso especial (fls. 260-274) que se reteve nos autos em decisão da lavra do Exmo. Sr. Des. Mazoni Ferreira, 2º Vice-Presidente desta Corte (fls. 282-283).

A douta Procuradoria-Geral de Justiça, em parecer da lavra da Exma. Sra. Dra. Hercília Regina Lemke, opinou pelo desprovimento do recurso (fls. 296-302).

Os autos vieram à conclusão para julgamento.

VOTO

O recurso preenche os pressupostos de admissibilidade. Passa-se à análise das suas razões.

Durante o trâmite da ação declaratória n. 023.98.052120-6 e da respectiva ação cautelar preparatória, ambas deflagradas pela Brasil Telecom S/A em face do Estado de Santa Catarina com o escopo de desincumbir-se do pagamento do ICMS sobre serviços denominados de "valor adicionado", foram realizados vários depósitos judiciais, os quais somavam, em 21-11-1998, segundo informação lançada na exordial da demanda de origem (fl. 3 do Anexo 1), R$ 97.581.337,75 (noventa e sete milhões, quinhentos e oitenta e um mil, trezentos e trinta e sete reais e setenta e cinco centavos).

A prestação jurisdicional foi entregue naquelas demandas favoravelmente à concessionária, a qual, porém, segundo informou o parquet na petição inicial da ação civil pública (ibidem), persistiria recolhendo o ICMS dos consumidores quanto aos referidos serviços. Somente no mês de janeiro de 2010, a arrecadação teria sido de R$ 1.035.848,66 (um milhão, trinta e cinco mil, oitocentos e quarenta e oito reais e sessenta e seis centavos).

Tendo em vista que os consumidores do serviço de telefonia, e não a concessionária, são os contribuintes de fato do referido tributo, o Ministério Público do Estado de Santa Catarina ajuizou a ação civil pública de origem, na qual pugnou, dentre outras medidas, e a título de antecipação de tutela, fosse sobrestado o levantamento dos valores depositados no curso daquelas demandas.

O Exmo. Sr. Dr. Hélio do Valle Pereira concedeu a tutela antecipada almejada pelo Ministério Público Estadual e obstou o levantamento dos valores em depósito com base nos seguintes argumentos:

Vistos, etc.

1. A ré, concessionária de serviços de telefonia, foi vitoriosa em ação declaratória tributária, sendo reconhecido que não é devedora de ICMS quanto a serviços auxiliares. Houve, por longo período, depósitos naqueles autos, os quais, agora, se buscam levantar.

Ingressa, então, esta ação civil pública, assinada pelo Ministério Público.

Afirma-se que os depósitos resultam de pagamentos feitos pelos consumidores dos serviços de telefonia, como contribuintes de fato. Por isso, a quantia devida deveria ser repassada a eles, ainda mais que a autora - mesmo beneficiada com o trânsito em julgado - ainda lance nas faturas aqueles valores (que não são mais litigiosos) e os transfira para o processo judicial.

2. O provimento liminar, estimo, tem natureza cautelar (e não antecipatória da tutela). O art. 12 da Lei da Ação Civil Pública permite esses dois tipos de medida.

Aqui, pretende-se a retenção de dinheiro ora depositado. Cuida-se de medida que lembra (lembra!) um arresto; é dizer, retém-se judicialmente bens de relevância econômica, de sorte a garantir o resultado útil de futura (e eventual) execução.

Além disso, sendo menos graves os efeitos da tutela cautelar, deve-se reiterar aquilo que foi reproduzido nas fls. 71. Não há risco de superior padecimento para a autora. O dinheiro permanecerá bem preservado, inclusive sendo adicionado de frutos. A empresa é uma das maiores do Brasil. Movimenta, por certo, bilhões. Não será a privação do numerário retido judicialmente que poderá abalar suas finanças.

Em contrapartida, haverá constrangimento isto sim se for liberada aquela quantia, sabidas as lamúrias dos devedores quanto à penhora de dinheiro.

Some-se a plausibilidade da tese do autor.

Causa desconforto, ao menos sem que tenha havido ainda o contraditório, que um tributo indireto seja - mesmo que de forma dissimulada - restituído para o contribuinte de direito. Se houve o transferência desse custo para o consumidor, seria dele a aptidão para ter de volta as quantias que efetivamente satisfez.

Impressionam-me as seguintes ponderações ministeriais:

"Ora, o beneficiário da ação declaratória da não incidência do ICMS sobre os servidores de valor adicionado é o consumidor, consequentemente, desde o seu trânsito em julgado não deveria mais haver a cobrança de tais valores e o crédito depositado judicialmente, pertencente à universalidade de consumidores e não as autoras, ser restituído aos consumidores.

Qualquer entendimento contrário, autoriza que, futuramente, seja motivo de comemoração pelos fornecedores a inclusão pelo Estado de um novo imposto que se entende indevido. Bastaria, em tal caso, contestar judicialmente o débito e aguardar, paciente e comodamente (in casu 11 anos), a decisão judicial definitiva, já com a perspectiva de que os valores , cobrados indevidamente dos pobres e vulneráveis consumidores, entrarão nos cofres da empresa posteriormente, apesar de não ter saído deles. Seria, com certeza, mais um verso pra ser acrescentado à música "Que país é este", do Legião Urbana, além de flagrante violação dos princípios Republicano, da Cidadania, da Igualdade, da Justiça e da Solidariedade, todos princípios estruturantes da Constituição Federal e ligados umbilicalmente à proteção consumidor." (fls. 04)

3. Poder-se-ia defender que esta decisão ofende a coisa julgada. Melhor seria dizer, na realidade, que o direito do contribuinte ao levantamento dos depósitos tributários seria efeito anexo da sentença. Fosse de uma forma ou de outra, entretanto, seria inviável que em outro feito - excetuada a ação rescisória - fosse tratado a tal respeito.

Vejo, ao menos de início, de outra maneira. O que aqui está sendo defendido é direito difuso. O Ministério Público atua em nome da coletividade. A decisão havida no outro feito foi tomada em relação ao Estado de Santa Catarina e, quando muito, faria coisa julgada apenas quanto a essa pessoa jurídica (art. 472 do CPC).

4. Assim, defiro a liminar para sustar o levantamento do dinheiro retido nos autos 023.98.052120-6 e 023.8.046682-5, apensando-se os autos.

Sustenta a agravante, como preliminar, a ilegitimidade ativa ad causam do Ministério Público, pois trataria a espécie de interesse disponível.

Estabelece o art. 81 do Código de Defesa do Consumidor que "A defesa dos interesses e direitos dos consumidores e das vítimas poderá ser exercida em juízo individualmente, ou a título coletivo".

O parágrafo único desse dispositivo esclarece:

A defesa coletiva será exercida quando se tratar de:

I - interesses ou direitos difusos, assim entendidos, para efeitos deste código, os transindividuais, de natureza indivisível, de que sejam titulares pessoas indeterminadas e ligadas por circunstâncias de fato;

II - interesses ou direitos coletivos, assim entendidos, para efeitos deste código, os transindividuais, de natureza indivisível de que seja titular grupo, categoria ou classe de pessoas ligadas entre si ou com a parte contrária por uma relação jurídica base;

III - interesses ou direitos individuais homogêneos, assim entendidos os decorrentes de origem comum.

A hipótese sub judice, sem dúvida, se encaixa na definição de interesses individuais homogêneos por força da atitude da concessionária, que busca se apropriar de indébitos tributários pertencentes não a ela própria, mas à coletividade dos consumidores. É na atitude da concessionária que reside a origem comum indispensável à homogeneidade do interesse.

A legitimação do Ministério Público para atuar em defesa dos aludidos interesses e direitos é estabelecida no art. 82 do mesmo Codex e, também, no art. 129, III, da Constituição Federal.

Sobre o tema, decidiu-se:

AÇÃO CIVIL PÚBLICA - PROTEÇÃO DE DIREITO DO CONSUMIDOR - LEGITIMIDADE DO MINISTÉRIO PÚBLICO

O pensamento moderno acerca da ação civil pública preconiza que este instrumento processual não se presta unicamente à defesa de interesses coletivos ou difusos, mas também de interesses individuais que se enquadram nas disposições do art. 127 da Constituição Federal. Noutros termos, a ação civil pública tem por escopo a defesa das garantias e dos direitos constitucionais que interessam à toda coletividade, mesmo que concernente à pessoa ou pessoas identificadas.

"Certos direitos individuais homogêneos podem ser classificados como interesses ou direitos coletivos, ou identificar-se com interesses sociais e individuais indisponíveis. Nesses casos, a ação civil pública presta-se a defesa dos mesmos, legitimado o Ministério Público para a causa. C.F., art. 127, caput, e art. 129, III. III. [...]" (RE n. 195.056, Min. Carlos Velloso) (AC n. 2009.040213-9, de Biguaçu, rel. Des. Luiz Cézar Medeiros, j. 6-4-2010).

Da mesma toada, veja-se:

"O Ministério Público detém legitimidade para ajuizar ação civil pública na defesa de interesses individuais homogêneos com substrato no Código de Defesa do Consumidor" (Apelação Cível n. 2004.029368-3, da Capital, relator Des. Luiz Cézar Medeiros, j. 26-9-06) (AI n. 2008.051514-1, da Capital, rel. Des. Vanderlei Romer, j. 10-2-2009).

Não há, assim, diferentemente do que defende a concessionária em seu recurso, afronta alguma aos arts. 3º e 267, VI do CPC.

Por outro lado, afirma a recorrente que a ação civil pública não seria o instrumento apropriado para a veiculação de pretensões tributárias, na forma do parágrafo único do art. 1º da Lei n. 7.347/1985, dispositivo segundo o qual "Não será cabível ação civil pública para veicular pretensões que envolvam tributos, contribuições previdenciárias, o Fundo de Garantia do Tempo de Serviço - FGTS ou outros fundos de natureza institucional cujos beneficiários podem ser individualmente determinados" (grifou-se).

Não se está, porém, diante de mera substituição processual em ação de repetição de indébito tributário, como quer fazer crer a recorrente.

A situação é bastante mais complexa, pois há prévia demanda declaratória de inexistência de indébito tributário na qual se realizaram depósitos milionários de valores pertencentes, em última instância, a milhares de consumidores.

Nesses termos, afasta-se o propalado óbice legal.

Por fim, argumenta a recorrente que o art. 166 do CTN não seria aplicável na hipótese de depósito judicial. Preconiza dita regra legal:

A restituição de tributos que comportem, por sua natureza, transferência do respectivo encargo financeiro somente será feita a quem prove haver assumido o referido encargo, ou, no caso de tê-lo transferido a terceiro, estar por este expressamente autorizado a recebê-la.

Porém, é certo que os consumidores (contribuintes de fato) efetivaram sim o pagamento do tributo nas faturas respectivas, e não o mero depósito - feito pela concessionária (contribuinte de direito). Do ponto de vista da empresa, não há restituição (e é este, aliás, justamente o punctum saliens da tese ministerial), mas, sob a ótica do consumidor, há.

Refuta-se, pois, também esse argumento, e, diante tendo em vista que se mostravam presentes os requisitos do art. 273 do CPC à antecipação dos efeitos da tutela almejada, nega-se provimento ao recurso.

É o voto.

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