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Presidente do STJ cassa liminar que impedia investigações de desvio de R$ 100 mi em MT

Da Redação

segunda-feira, 20 de fevereiro de 2006

Atualizado às 08:53


Presidente do STJ cassa liminar que impedia investigações de desvio de R$ 100 mi em MT


O presidente do STJ, ministro Edson Vidigal, cassou as liminares concedidas pelo desembargador do TJ/MT Manoel Ornellas de Almeida, as quais sustavam as investigações de 140 inquéritos civis com o objetivo de apurar desvio de dinheiro público, estimado em R$ 100 milhões. As liminares concedidas pelo magistrado atenderam ao pedido do deputado Humberto Bosaipo (PFL). O parlamentar é um dos investigados pelo Ministério Público daquele estado.


"Diante de tal contexto, a liminar reclamada efetivamente destrata o interesse social de que todo agente público deve prestar contas de suas ações e afronta o princípio da supremacia do interesse público sobre o interesse privado, uma vez que inviabiliza a apuração dos fatos pela sociedade, em detrimento do povo e do erário", diz o ministro Vidigal na decisão.

E prosseguiu: "Destarte, tenho por demonstrado, à saciedade, grave lesão ao interesse público e à ordem administrativa na manutenção da liminar concedida, na medida em que impossibilita o Ministério Público do Estado do Mato Grosso de efetivar sua função institucional relacionada à defesa do patrimônio público e social."


"Assim, considerando presentes os pressupostos necessários à concessão da medida extrema, defiro o pedido para suspender as decisões liminares proferidas pelo desembargador relator Manoel Ornellas de Almeida nos autos do Mandado de Segurança n.º 41.217/2005", decidiu o presidente do STJ.


Investigações


O procurador-geral de Justiça do Estado de Mato Grosso, Paulo Roberto Jorge do Prado, e outros dois procuradores daquele estado estiveram dia 16 no Gabinete da Presidência do STJ, onde relataram os fatos. Eles haviam protocolado recurso para sustar os efeitos de uma liminar concedida pelo Tribunal de Justiça que impedia os procedimentos em 140 inquéritos civis. Esses inquéritos, que se desenrolam há três anos, têm por objetivo a apuração de desvio de dinheiro público de cerca de R$ 100 milhões na Assembléia Legislativa do Estado de Mato Grosso.


"Nas investigações constatamos empresas fantasmas que teriam recebido recursos públicos para prestarem serviços à Assembléia Legislativa. Ao verificarmos os endereços dessas empresas, descobrimos que são terrenos baldios, casas humildes cujos cidadãos sequer são proprietários das tais empresas. Com isso, milhões e milhões de reais foram desviados dos cofres públicos e nós queremos saber no bolso de quem esse dinheiro foi parar", disse o procurador Paulo Prado.


O procurador disse que as investigações apontam para o primeiro secretário da AL/MT, deputado José Riva (PP), e para o deputado Humberto Bosaipo (PFL). As investigações estão sendo desenvolvidas há três anos e, segundo Paulo Prado, existe o envolvimento de mais 13 pessoas. O grupo de procuradores manifestou estranheza com a liminar manuscrita concedida no dia 19/12/2005 por desembargador do TJ-MT que "tranca" todas as investigações.


Queda de braços


De acordo com a petição protocolada pelos procuradores estaduais, os inquéritos civis tiveram início a partir da mega-operação "Arca de Noé", deflagrada pela Polícia Federal juntamente com o Ministério Público Federal e Ministério Público estadual. Naquela ocasião foram apreendidas centenas de cheques da AL/MT em estabelecimentos de 'factoring' de propriedade de João Arcanjo Ribeiro, o "comendador" Arcanjo.


Ainda segundo a petição, os cheques foram emitidos "em nome de empresas de fachada", como, por exemplo, a Cosmo Publicidade e Eventos Ltda., O S Ribeiro Serviços (Dedetizadora Mundial), ALC Silva Serviços e Papelaria Malboro. Os promotores informaram que há casos de empresas inexistentes e outras que estão irregulares. Por isso os inquéritos civis foram iniciados para "comprovar se estas empresas realmente prestaram serviços ou forneceram bens à Assembléia Legislativa do Estado de Mato Grosso ou se simplesmente foram utilizadas para o desvio de dinheiro público", diz a petição.


E prosseguiram: "À toda evidência, o impetrante conduziu o ilustrado relator a equívoco, quando, ao reivindicar a extensão dos efeitos da liminar concedida no Mandado de Segurança nº 41217/2005, aos demais inquéritos civis contra si manejados, afirmou que os fatos apurados nos inúmeros procedimentos investigatórios eram os mesmos". Com isso, o deputado Bosaipo tentou mostrar que os vários inquéritos civis são idênticos, mas os procuradores afirmam que cada procedimento tem por objetivo a investigação de determinada irregularidade.


"Cada um dos inúmeros inquéritos civis instaurados em desfavor do impetrante corresponde a uma investigação autônoma, independente, sendo que cada inquérito investiga uma empresa fornecedora diversa, que recebeu cheques em condições suspeitas da Assembléia Legislativa do Estado de Mato Grosso", disse o procurador Paulo Prado.


Durante a audiência, o ministro Vidigal ouviu atentamente o relatório apresentado pelo grupo de procuradores. Ao término da reunião, eles reclamaram que as denúncias não têm chegado às páginas dos jornais locais nem têm sido levadas ao ar pelas emissoras de televisão regionais. De acordo com Paulo Prado, os jornais de grande circulação, como 'O Estado de S. Paulo" e "Folha de S. Paulo", quando publicam alguma reportagem sobre os fatos, sequer chegam às bancas.


"Os exemplares são comprados. Isso tem impedido a população de tomar conhecimento dos desmandos que ocorrem e agora estão chegando ao conhecimento das autoridades de Brasília, como é o caso do presidente do STJ, ministro Edson Vidigal", disse o procurador.

A seguir a íntegra de decisão do presidente do STJ, ministro Edson Vidigal:


SUSPENSÃO DE SEGURANÇA Nº 1.592 - MT (2006/0032031-2)


REQUERENTE : MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE MATO GROSSO

REQUERIDO : DESEMBARGADOR RELATOR DO MANDADO DE SEGURANÇA NR 412172005 DO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DO MATO GROSSO

IMPETRANTE : HUMBERTO MELLO BOSAIPO

ADVOGADO : SÉRVIO TÚLIO MIGUIES JACOB


DECISÃO


Suspensão de Segurança ajuizada pelo Ministério Público do Estado de Mato Grosso, objetivando sobrestar os efeitos de decisões liminares proferidas no Mandado de Segurança n.º 41217/2005, em trâmite no Tribunal de Justiça do Estado do Mato Grosso, que determinaram o trancamento de 142 (cento e quarenta e dois) inquéritos civis instaurados para apurar suposto cometimento de ato de improbidade administrativa pelo Deputado Estadual Humberto Mello Bosaipo.


Reclamando inobservância às determinações contidas na Resolução n.º 001, art. 9º, do Conselho Superior do Ministério Público, que estipula o prazo de 90 (noventa) dias para a conclusão de inquérito civil, prorrogável por mais 30 (trinta) dias, Humberto Mello Bosaipo postulou, em Ação Mandamental, o trancamento dos Procedimentos Administrativos n.ºs 000202-02/2003 e 000823-2/2004, porquanto instaurados contra si, respectivamente, em 13.6.2002 e 15.12.2003.


Sob o entendimento de que " ninguém poderá ficar submetido, ab aeternum às investigações de qualquer órgão no sistema jurídico pátrio", o Desembargador Relator Manoel Ornellas de Almeida concedeu liminar para para trancar os procedimentos administrativos apontados no tocante ao impetrante.


Posteriormente, deferindo pedido formulado por Humberto Mello Bosaipo, estendeu os efeitos da liminar concedida para trancar outros cento e quarenta inquérito civis.


Daí o ajuizamento deste Pedido de Suspensão de Segurança pelo Ministério Público do Estado do Mato Grosso, reclamando grave lesão ao interesse público e à ordem administrativa.


Esclarece o requerente que os inquéritos civis em apreço "resultam das escandalosas fraudes que vieram à tona com a megaoperação 'Arca de Noé', deflagrada pela Polícia Federal em conjunto com o Ministério Público Federal e Estadual, resultando na apreensão de centenas de cheques da Assembléia Legislativa do Estado de Mato Grosso em estabelecimentos de 'factoring', de propriedade de João Arcanjo Ribeiro, vulgo "Comendador Arcanjo', cheques estes, emitidos em nome de empresas de fachada, em condições suspeitas e inexistentes" (fls. 9/10).


Também ressalta que cada inquérito corresponde a uma investigação autônoma, envolvendo empresas distintas, com fortes suspeitas de desvio e apropriação indevida de recursos.


Afirma que a demora nas investigações decorre da complexidade dos fatos, envolvendo inúmeras empresas, quebra de sigilo bancário, oitiva de pessoas, bem como em razão de ações do próprio Deputado e da Assembléia, "sonegando dados e documentos, não respondendo aos questionamentos formulados e não enviando documentos e informações requisitadas"(fl. 14).


De outro lado, obtempera que o prazo fixado na Resolução n.º 01/2001 do Conselho Superior do Ministério Público do Estado de Mato Grosso deve ser considerado impróprio, vez que determinado pela própria instituição, com o único objetivo de melhor organizar a sua atuação. Destarte, eventual descumprimento somente poderia acarretar sanções administrativas internas ao encarregado das investigações, e não a decadência do direito de agir do Ministério Público.


O trancamento dos referidos inquéritos civis, segundo afirma, resultaria em premiar o ímprobo, em detrimento do povo e do erário, afrontando o princípio da supremacia do interesse público sobre o interesse privado.


Finaliza sustentando grave lesão ao interesse público primário e à ordem administrativa, posto encontrar-se o Ministério Público Estadual, por força da decisão liminar reclamada, impossibilitado de efetivar a sua função institucional.


Decido


Sem adentrar na questão de fundo da impetração, cujo exame não é possível nesta via excepcional, cumpre observar que os procedimentos investigatórios em apreço apuram sérias suspeitas de desvio e apropriação indevida de vultosos recursos do erário por agentes públicos.


Diante de tal contexto, a liminar reclamada efetivamente destrata o interesse social de que todo agente público deve prestar contas de suas ações e afronta o princípio da supremacia do interesse público sobre o interesse privado, uma vez que inviabiliza a apuração dos fatos pela sociedade, em detrimento do povo e do erário.


Destarte, tenho por demonstrado, à saciedade, grave lesão ao interesse público e à ordem administrativa na manutenção da liminar concedida, na medida em que impossibilita o Ministério Público do Estado do Mato Grosso de efetivar sua função institucional relacionada à defesa do patrimônio público e social.

Assim, considerando presentes os pressupostos necessários à concessão da medida extrema, defiro o pedido para suspender as decisões liminares proferidas pelo Desembargador Relator Manoel Ornellas de Almeida nos autos do Mandado de Segurança n.º 41.217/2005.


Comunique-se.

Intime-se.

Publique-se.

Brasília (DF), 16 de fevereiro de 2006.


MINISTRO EDSON VIDIGAL

Presidente
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Fonte: STJ