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Horário Eleitoral, gratuito ?

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Da Redação

quarta-feira, 3 de maio de 2006

Atualizado em 2 de maio de 2006 09:43

 

O que é realmente gratuito no horário eleitoral ?

 

Os brasileiros irão viver em 2006 mais um ano eleitoral. Até 1º de outubro os eleitores serão literalmente cercados pelos candidatos. Horário eleitoral na televisão, no rádio, comícios em praças públicas, debates, santinhos, promessas, promessas, promes...

"Interrompemos a nossa programação para exibição do horário eleitoral gratuito".

O aviso acima já se tornou conhecido e serve para informar o ouvinte, ou telespectador, que a partir daquele momento as emissoras cederão seu espaço (e os eleitores a paciência) para os partidos apresentarem suas campanhas.

 

Alguns desligam a TV e preferem fazer bolinho de chuva nesse momento. Outros encaram a realidade e se divertem com as "figuras partidárias".

 

Alertados por uma querida leitora, este informativo foi procurar saber o que de fato significava o verbete "gratuito" nesse horário eleitoral que somos compelidos a suportar.

 

E não é que se trata de uma "propaganda enganosa". A primeira que os partidos já cometem, ainda com seus candidatos.

 

Para não surgir qualquer coisa que pareça um "estelionato eleitoral", este vibrante matutino quer pôr fim, já nesse pleito, dos dizeres "horário eleitoral gratuito".

 

Explicamos o porquê.

 

A lei eleitoral estipulou o tempo de cada partido na TV e no Rádio, evitando, assim, e com acerto, que o poder econômico fosse a motriz única destes importantes veículos de massa.

 

Dando-se o acesso a todos os partidos, cada qual de acordo com sua representação, estaria democratizado o acesso.

 

O legislador, ainda mais prudente, delimitou o horário eleitoral como sendo o única propaganda a ser veiculada nessas mídias.

 

De fato, o art. 44 da Lei 9.504/97 é enfático ao dizer que a propaganda eleitoral no rádio e na televisão restringe-se ao horário gratuito, vedado-se a veiculação de propaganda paga.

 

E nos artigos 47 e 49, a mesma lei define os horários de exibição, nas emissoras de rádio e televisão, da propaganda eleitoral.

 

E a pergunta que muitos fazem, é como as empresas - tão controladoras - suportam tão gentilmente o uso de seus valiosos espaços comerciais com um fatigante palanque midiático ?

 

E a resposta é simples. Porque o Horário Eleitoral Gratuito não é tão gratuito assim.

 

Aliás, de gratuito não tem nada.

 

Para financiar seus gastos, o governo utiliza-se de mecanismos tributários.

 

Como bem sabem os migalheiros, o sistema tributário é permeado por desonerações que podem servir para diversos fins, como, por exemplo, compensar gastos realizados pelos contribuintes com serviços não atendidos pelo governo; compensar ações complementares às funções típicas de Estado desenvolvidas por entidades civis; promover a equalização das rendas entre regiões e/ou incentivar determinado setor da economia.

 

Nesse caso, essas desonerações irão se constituir em uma alternativa às ações Políticas de Governo. E, tal grupo de desonerações irá compor o que se convencionou denominar pela Secretária da Receita Federal de gastos tributários.

"Gastos tributários são gastos indiretos do governo realizados por intermédio do sistema tributário visando atender objetivos econômicos e sociais. São explicitados na norma que referencia o tributo, constituindo-se uma exceção ao sistema tributário de referência, reduzindo a arrecadação potencial e, conseqüentemente, aumentando a disponibilidade econômica do contribuinte. Têm caráter compensatório, quando o governo não atende adequadamente a população dos serviços de sua responsabilidade, ou têm caráter incentivador, quando o governo tem a intenção de desenvolver determinado setor ou região".

Um dos principais gastos tributários, relacionado inclusive no demonstrativo anual da Receita Federal, é o chamado Horário Eleitoral Gratuito.

 

Em verdade, o acesso ao horário eleitoral é que é gratuito, e não sua exibição.

 

Com efeito, as emissoras de rádio e televisão obrigadas à divulgação podem abater do IR, pela exibição, 80% do que ganhariam com a venda do espaço publicitário no tempo cedido aos partidos.

 

Esse benefício foi regulamentado em 2000, mas já estava previsto nas Leis 9.096/95 e 9.504/97, em seus artigos 52 e 99, respectivamente.

Lei 9.096/95 - Art. 52.

 

Parágrafo único. As emissoras de rádio e televisão terão direito a compensação fiscal pela cedência do horário gratuito previsto nesta Lei.

 

Lei 9.504/97 - Art. 99.

 

As emissoras de rádio e televisão terão direito a compensação fiscal pela cedência do horário gratuito previsto nesta Lei.

Em 2000, o então presidente Fernando Henrique Cardoso, regulamentou o valor do benefício, com a assinatura do Decreto 3.516, e posteriormente do Decreto 3.786, de 2001, definindo que a partir do ano-calendário de 2000, as emissoras de rádio e televisão - obrigadas à divulgação da propaganda partidária gratuita - poderiam excluir do lucro líquido, para efeito de determinação do lucro real, uma percentagem do preço do espaço comercializável - que seria efetivamente utilizado pela emissora em programação destinada à publicidade comercial - no período de duração daquela propaganda.

 

Apesar dos decretos alcançarem apenas as eleições subseqüentes a 2000, foi possível, dentro do prazo prescricional e decadencial, requerer administrativamente ou judicialmente a repetição do indébito em referência ao pleito de 1998 com base no Decreto nº 2.814/98.

 

O benefício concedido às emissoras acarreta, anualmente, uma perda de arrecadação em mais de 100 milhões.

 

Mas não é só.

 

Esses números só tendem a aumentar, diante do advento do Decreto 5.331, assinado pelo presidente Lula em 2005, que muda os critérios dessa compensação fiscal.

 

Com as novas regras, o desconto do IR será calculado sobre os valores dos anúncios de tabela cheia e não mais no período de exibição da propaganda política.

 

Ademais, segundo o decreto, o preço do espaço comercializável é o preço de propaganda da emissora, comprovadamente vigente na data e no horário imediatamente anterior ao das inserções da propaganda partidária ou eleitoral.

 

E a pergunta que não quer calar : como a receita comprova o valor do espaço comercializável ?

 

A lei deixa, evidentemente, ao alvedrio das emissoras, o quanto elas vão deixar de arrecadar. Para conferir esses dados, eliminando qualquer nebulosidade, bastaria que a Receita Federal publicasse o quanto cada emissora de rádio ou televisão deixou de arrecadar em virtude da veiculação obrigatória.

 

Mas não é isso que se faz. Procurada insistentemente nos últimos dias, para que Migalhas pudesse mostrar a seus doutos leitores essa prestação de contas, o órgão da coletoria não se manifestou.

 

Este poderoso rotativo, no entanto, traz aos leitores os valores que foram deixados de arrecadar nos últimos anos, na totalidade das emissoras.

Ano *

Valores Estimados (R$)

2007

450.028.104

2006

191.603.574

2005

283.548.965

2004

238.584.714

2003

174.109.907

2002

121.539.800

2001

129.295.638

*Os valores estimados para o ano referem-se ao que foi declarado no ano anterior pelas emissoras.

Agora, como é possível para a Receita fiscalizar a exatidão das deduções, já que ela não tem acesso ao real valor da propaganda comercial das emissoras ?

 

Em 2006, por exemplo, a Receita calcula que as emissoras irão descontar do Imposto em torno de R$ 191 milhões, somente com as inserções avulsas de partidos políticos, mais a campanha do referendo do desarmamento, que ocupou em média 48 minutos diários da grade de cada emissora em 2005. Fica fácil prever então, com as eleições deste ano, que em 2007 os números irão triplicar.

 

Haja paciência e dinheiro no bolso do contribuinte.

 

Por tudo isso, Migalhas pede que o Tribunal Superior Eleitoral, no uso de suas importantíssimas atribuições (aliás, as eleições só foram legítimas no país quando passaram a ser feitas pelo Judiciário), que impeça o uso do "gratuito" nos dizeres do Horário Eleitoral, uma vez que todos os contribuintes é que acabam arcando com o custo dessa veiculação.

Termos em que,

Pede deferimento.

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Ps. Para ler a íntegra das leis e dos decretos, basta clicar sobre seus números.

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