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Carta ao povo brasileiro do advogado e escritor Ronaldo Poletti

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Da Redação

segunda-feira, 16 de outubro de 2006

Atualizado às 08:18


Carta

 

O advogado e escritor Leon Frejda Szklarowsky enviou à redação de Migalhas na sexta-feira (Migalhas nº 1.516 - 13/10/2006 - clique aqui) uma carta ao povo brasileiro. Hoje, o migalheiro envia a carta do dr. Ronaldo Poletti, que deu origem a sua. Confira abaixo.

 

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Prezado Leon,

 

Escrevo-lhe como gostaria de dirigir-me a todo o povo brasileiro.

 

A eleição de 3 de outubro causou-nos um grande impacto. Não tanto pelo resultado plebiscitário, contendo a rejeição do governo por mais da metade dos eleitores, mas pela circunstância de cerca de cento e vinte milhões de pessoas haverem comparecido às urnas, em uma soma de vontades inédita no mundo pela sua quantidade.


Diante disso, alguma coisa há de acontecer.

 

Não nos basta votar e ser votado. A consciência nacional parece impor caminhos para a redenção moral do Brasil e da Política.

 

O povo brada pelas urnas que se refaça o laço ético dos brasileiros, fundado nos valores espirituais da nacionalidade e voltado para o bem comum.

 

O interesse público vale dizer, o interesse do povo deve sobrepor-se aos interesses individuais, nem sempre confessáveis. O sentimento republicano não permite menosprezo à coisa pública.

 

Se o Estado ético está superado por que não se admite a imposição de uma linha de conduta moral conforme ideologias ou religiões, não devemos por isso afastar o dever dos políticos de cumprirem de maneira escorreita o seu dever para com o povo. Dever de honradez, de correção, de incorruptibilidade, de não fazer concessões aos que se corrompem, de não oferecer qualquer tipo de tolerância, menos ainda aos companheiros e correligionários, protegidos pelo manto partidário, que não hesitam em fazer seus os negócios públicos. Dever de dar o exemplo, para que os governados espelhem a inafastável transparência dos governantes e sejam como eles honestos, probos, corretos.

 

A democracia, no Brasil, precisa afirmar-se como um governo de permanente participação do povo, por intermédio dos seus melhores, não dos piores nem dos que compactuam com a incompetência no sinal visível da prevalência do companheirismo sobre todos os outros valores.

 

Queremos uma sociedade de iguais, onde o mérito possa ser auferido de maneira justa e equilibrada. Queremos uma meritocracia. Uma aristocracia da inteligência, nascida da igualdade de oportunidades.

 

Já não aceitamos as desigualdades sociais e econômicas, nem a demagogia que delas se apropria para enganar o povo trabalhador com promessas medíocres de distribuição de renda, ao tempo em que se alia, na verdade, aos poderosos das finanças, aos beneficiários da usura.

 

Se intentamos o bem do povo, como um todo, devemos buscar a paz e a segurança para o trabalho, a seriedade nas contas públicas, na realização das despesas, nas prioridades orçamentárias de natureza social, com o que será possível diminuir a receita, reduzir os impostos e possibilitar salários compatíveis com o esforço do trabalho.

 

Almejamos a igualdade nascida do consenso e da concórdia, não da luta de classes, nem do ódio. A igualdade como conseqüência do esforço da sociedade, não dos impulsos ou modismos governamentais.

 

Manifesta-se, assim, a confiança no homem brasileiro situado em seus círculos de vida, no seu trabalho, na sua família, no seu clube, na sua igreja, na sua cidade, no seu bairro, no seu quarteirão e na sua rua. Não se trata de privilegiar o capital em detrimento do trabalho, mas de harmonizá-los, para que dessa harmonia ressurja a Pátria forte e linda na mocidade das escolas.

 

Já não nos basta a lei das inelegibilidades.

 

Pretendemos a lei das elegibilidades, onde se afastem do poder os ignorantes para que todos no futuro mereçam a benção de um saber mínimo, aptos a exercerem aquele poder com dignidade, sem atropelos na língua ou impropriedades mentais ou verbais.

 

Precisamos acabar com a irresponsabilidade, no sentido técnico da expressão, dos representantes do povo. Estes devem ficar subordinados aos eleitores, por exemplo presentes nos partidos. O Estado de Direito é o governo das leis e não dos homens. As leis é que devem ser a diretriz dos governantes. Por isso, é preciso que os representantes do povo não expressem fictamente a vontade da nação, independente da vontade real do povo, mas que este se faça presente por intermédio de uma participação cada vez mais expressiva. Que o povo casse os traidores do mandato que lhes foi outorgado. Que eles jamais retornem. Que o ostracismo seja mais duradouro e permanente.

 

Impõe-se, pelo grito das urnas, uma reforma política.

 

Se a intenção for a democracia partidária, que se leve à exacerbação o princípio da fidelidade partidária à doutrina da agremiação e a seu programa de governo. Os partidos devem ter uma participação permanente nos canais de rádio e televisão e não às vésperas das eleições. Os candidatos devem ser escolhidos pelas bases partidárias não a elas impostas pelas cúpulas. O sistema distrital misto, com eleição majoritária nos distritos, e representação proporcional pelas listas partidárias, previamente estabelecidas, pode aproximar o homem do representante, obrigando correção política a esse último.

 

Não haverá povo brasileiro se este não consistir, como na expressão de Cícero, na reunião de todos em torno dos interesses comuns [dos valores espirituais da nacionalidade brasileira] e de um consenso em torno do direito.

 

Que se implante a verdadeira democracia!

 

Que o povo dê a última palavra sobre o direito!

 

Que o fantasma da corrupção, da banalização dos costumes políticos e da subversão dos interesses públicos pelo indisfarçável assédio, em proveito próprio, do tesouro do povo, desapareça para sempre.

 

O segundo turno das eleições oferece-nos uma oportunidade única para a regeneração política do Brasil.


Abraça-o fraternalmente, na certeza de que o faço a um homem livre e de bons costumes, o Ronaldo Poletti.

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