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PGR sugere ao STF parâmetros para revista íntima em presídios

Parecer foi encaminhado por Aras com proposta para inspeção apenas quando absolutamente imprescindível.

Da Redação

quinta-feira, 24 de setembro de 2020

Atualizado às 10:15

O PGR Augusto Aras encaminhou ao STF nesta quarta-feira, 23, proposta acerca da revista íntima para ingresso em estabelecimento prisional. Trata-se de parecer no agravo do RE 959.620, que tem repercussão geral reconhecida (tema 998).

Na peça, dirigida ao ministro relator Edson Fachin, Aras manifesta-se pelo não conhecimento do recurso, pela fixação das teses por ele sugeridas e pela modulação dos efeitos, concedendo aos Estados o prazo máximo de um ano para que adotem as medidas necessárias à adequação de seus protocolos de ingresso em presídios, considerando-se como protocolo geral o controle mecânico/tecnológico.

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O caso

O agravo refere-se à decisão que não admitiu RE interposto pelo MP/RS contra acórdão do TJ/RS, que absolveu a irmã de um detento por ter tentado ingressar em estabelecimento prisional com droga. Ela havia sido condenada, em 1ª instância, a 1 ano e 11 meses de reclusão, em regime aberto, e teve a pena substituída por restritiva de direitos, pela prática de tráfico de drogas. O TJ/RS, no entanto, reformou a decisão para absolvê-la, por entender que a prova produzida seria ilícita, porque ofenderia o princípio da dignidade humana e a proteção ao direito de intimidade, à honra e à imagem das pessoas.

No recurso ao Supremo, o MP/RS apontou que a decisão do TJ afrontou os princípios da segurança e da ordem pública, por ter afastado o crime de tráfico de drogas e ter interpretado e aplicado os princípios da dignidade e da intimidade supostamente de forma equivocada. Alegou ainda que a vedação de inspeção íntima representaria salvo-conduto à prática de crimes. Os ministros do STF, por unanimidade, reconheceram tratar-se de questão constitucional e de repercussão geral.

Revista íntima

A revista manual - na qual servidor habilitado, do mesmo sexo do revistando, apalpa o corpo do visitante, por cima de sua roupa e em local privativo - deve ser feita apenas em casos específicos, quando houver fundada suspeita de que o revistando é portador de objeto ou substância proibidos legalmente e/ou que venham a colocar em risco a segurança do estabelecimento.

Não há legislação Federal expressa sobre o tema. Alguns Estados editaram leis ou resoluções que proíbem ou restringem a realização da revista íntima. Em muitos Estados, a revista íntima manual é o protocolo geral de ingresso dos visitantes nos presídios, mediante práticas de desnudamento total ou parcial, inspeções genitais e esforços físicos repetitivos, indo de encontro ao direito à intimidade e à integridade (física e psíquica) das pessoas que queiram ter acesso aos estabelecimentos penais para manter contato com presos. Em alguns Estados, há vedação por meio de decisões judiciais.

Para Aras, a realização de revista íntima nesses moldes viola não somente as regras e os princípios constitucionais, mas também acordos internacionais de direitos humanos firmados pelo Brasil, recomendações da Corte Interamericana de Direitos Humanos, da Organização das Nações Unidas e da Corte Europeia de Direitos Humanos, e a jurisprudência internacional sobre o tema. Regimes constitucional e internacional de direitos humanos proíbem a prática sistemática e generalizada de procedimentos invasivos e incompatíveis com a preservação da dignidade humana.

"A segurança do sistema prisional não justifica atos humilhantes, especialmente quando possa ser obtida por meios outros menos invasivos. A revista íntima há de ser exceção."

No parecer, Augusto Aras acrescenta que a revista íntima será constitucional quando embasada em elementos concretos e justificaria de suspeita. E, ainda assim, há que ser realizada de forma respeitosa, seguindo critérios previamente estabelecidos.

Para o PGR, admite-se a revista íntima, excepcionalmente, se for verificada fundada e objetiva suspeita, diante de fato identificado e de reconhecida procedência, de porte ilícito de objetos ou substâncias cuja entrada seja proibida em presídios, ou ante a existência de óbice concreto, de caráter pessoal, que impeça a adoção de meios alternativos e mecânicos de revista. Assim, caso seja realizada legitimamente, a prova produzida em revista íntima é lícita.

Sugestão de teses

De acordo com o procurador-Geral, o recurso interposto no caso concreto não deve ser conhecido, em razão de questões de forma. Contudo, Augusto Aras sugere a fixação das seguintes teses em relação à questão constitucional discutida, nos moldes da sistemática da repercussão geral:

I) É inconstitucional a revista íntima como protocolo geral de ingresso nos presídios.

II) É constitucional a possibilidade de realização de revista íntima em caráter excepcional quando (i) o estado de saúde ou a integridade física impeça que a pessoa a ser revistada seja submetida a determinados equipamentos de revista eletrônica, ou (ii) quando, após revista eletrônica, subsista fundada e objetiva suspeita de porte de objetos ou substâncias cuja entrada em presídios seja proibida.

III) A revista íntima excepcional há de observar ao menos às seguintes condicionantes: (i) ter a concordância da pessoa a ser revistada; (ii) ser realizada em local reservado, por agente prisional do mesmo gênero do revistado, que cuidará de preservar a integridade física, psicológica e moral do visitante; (iii) vedar-se o desnudamento total ou parcial, o uso de espelhos, esforços físicos repetitivos e a introdução de quaisquer objetos nas cavidades corporais do revistado; (iv) facultar-se o acompanhamento do ato por pessoa de confiança do revistado.

IV) É admitida a inspeção de órgãos genitais apenas quando absolutamente necessária e imprescindível para alcançar objetivo legítimo em caso específico, concretamente e previamente fundamentada.

V) É insuficiente para tornar ilícita a prova o fato de ter sido produzida em revista íntima, mesmo que os termos em que foi realizada possam influenciar no juízo sobre sua licitude.

O PGR sugere ainda a modulação dos efeitos, para que os Estados, no máximo em um ano, adaptem seus protocolos de ingressos aos termos das teses fixadas.

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