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Clèmerson Merlin Clève assina prefácio do livro "Grandes Temas de Direito Administrativo"

Acaba de ser lançado o livro "Grandes Temas de Direito Administrativo", em homenagem ao professor Paulo Henrique Blasi. A obra conta com o brilhante prefácio do dr. Clèmerson Clève.

Da Redação

segunda-feira, 27 de outubro de 2008

Atualizado às 08:16


Lançamento

Clèmerson Merlin Clève assina prefácio do livro "Grandes Temas de Direito Administrativo"

Foi lançada neste mês de outubro, em SC, a obra "Grandes Temas de Direito Administrativo", pela Millennium Editora e pelo Conceito Editorial.

Quarenta e dois textos, escritos por importantes autores da área do direito público, foram reunidos pelo Professor do Curso de Direito da UFSC e Desembargador Volnei Ivo Carlin para homenagear um dos maiores administrativistas do país e fundador do festejado programa de pós-graduação em direito da UFSC: o Professor Paulo Henrique Blasi.

Os estudos que compõem esta coletânea são demonstrações eloqüentes de que se trata de homenagem muito merecida. Clèmerson Merlin Clève, Professor Titular da Faculdade de Direito da UFPR, que foi aluno do Professor Blasi, escreveu o prefácio da obra, que pode ser conferido a seguir :

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"No final dos anos setenta e início dos oitenta, o país compunha um modelo de pós-graduação em sentido estrito que, anos mais tarde, o levaria, na área, à liderança da América Latina. Algumas instituições de ensino superior - seguindo a nova política - começavam a redesenhar ou implantar os seus programas de mestrado e doutorado em Direito.

Tais cursos, pelo menos os melhores, foram responsáveis pela emergência de um novo momento nas pesquisas jurídicas do país. Quando a reflexão desenvolvida no terreno acadêmico abraça a experiência decorrente do mundo da vida, um novo tipo de saber aparece: menos auto-suficiente, mais crítico, mais profundo e rigoroso do ponto de vista das exigências epistêmicas. Ninguém poderá negar que nas últimas três décadas uma onda de renovação dos temas enfrentados e da forma de articulação dos discursos vem se manifestando em todo o mundo mas, igualmente, com o necessário apoio dos centros de pesquisa e estudo, no Brasil.

Curiosamente, um dos pólos responsáveis pela oxigenação dos estudos jurídicos foi concebido fora dos grandes centros urbanos. Com efeito, em Florianópolis, um programa de pós-graduação chamava a atenção pela novidade dos métodos que adotava, pela consistência da proposta desenvolvida, pelo ineditismo das abordagens, enfim pela inovadora concepção que experimentava.

Florianópolis, a encantadora capital de Santa Catarina, ainda não dispunha da estrutura urbana que hoje apresenta. Tratava-se de uma pequena, mas sempre bela, capital, ainda sem uma sólida tradição universitária. Como se sabe, até os anos trinta, os jovens catarinenses desejosos de cursar o ensino superior, mesmo o de Direito, dirigiam-se a outros centros.

O curso jurídico foi fundado na década de trinta. Embora dispondo de juristas reconhecidos, a capital de Santa Catarina estava longe de possuir uma vivência acadêmica mais profunda. Pois mesmo assim, desenvolveu-se na Ilha de Santa Catarina uma das mais interessantes experiências no território do estudo jurídico pós-graduado. Ali, jovens provenientes de todas as partes do país, aprendiam com notáveis professores, alguns estrangeiros.

Havia um clima apropriado, uma vontade coletiva de enfrentamento dos novos temas e autores, uma adesão às exigências da pesquisa mais densa, uma forma diferente de olhar o Direito, sempre atento às suas conexões com os mundos da política, da economia ou da moral. Um olhar tocado pela interdisciplinaridade, algo novo num tempo em que os estudos jurídicos nas velhas faculdades, muitas vezes, não passavam de um transitar apressado pelos textos legais, através de comentários superficiais ou mais aprofundados da normatividade institucionalizada.

No Campus da Trindade tudo era diferente. Na verdade, a Universidade Federal de Santa Catarina atraia professores e pesquisadores talentosos dos rincões mais distantes, criando uma verdadeira comunidade universitária, capaz de inovar em diferentes áreas do saber. O programa de mestrado em Direito se inscrevia nesse contexto renovado, é verdade.

Todavia, com uma força e uma dinâmica particulares. A singularidade do programa o apartava de outros tantos, igualmente respeitados, criados por outras universidades, muitas vezes situadas em centros com mais tradição na pesquisa jurídica.

Como explicar o fato de que uma das mais fecundas experiências no campo dos estudos jurídicos pós-graduados nasceu precisamente em Florianópolis, à época uma pequena e formosa cidade que não dispunha, como hoje, das vantagens das maiores capitais? Talvez uma nota de memória pessoal possa responder à indagação.

Concluí o bacharelado em Direito na quase centenária Faculdade de Direito da Universidade Federal do Paraná, onde, atualmente, titular, exerço a docência. A instituição não oferecia, ainda, os seus respeitados programas de mestrado e de doutorado. De modo que, para a continuidade dos estudos, era necessário sair de Curitiba. Desde o quarto ano, no entanto, com amigos de jornada, acompanhava o que vinha acontecendo em outras praças, particularmente em São Paulo, onde mais tarde fiz o doutoramento, e em Santa Catarina.

A experiência catarinense chamava a atenção, como disse, pela novidade, pela intensidade, pela visão aberta do fenômeno jurídico, pelo modo distinto de fazer ciência num território marcado pelo convencionalismo e, muitas vezes, falta de imaginação.

O sucesso da fórmula catarinense, que ficou gravada na memória brasileira, e que ainda é reverenciada país afora, tinha a marca de um grupo liderado pelo Professor Paulo Henrique Blasi. Com efeito, foi ele que, com o apoio inestimável de amigos, desenhou e plantou aquele programa de estudos pós-graduados que atraia feito ímã jovens bacharéis e professores de todos os cantos da república, conformando uma comunidade de reflexão e pesquisa invulgar.

O Professor Blasi, como o chamávamos carinhosamente, manifestava liderança natural, decorrente também da autoridade conferida pelo cargo de Coordenador, que exerceu por vários períodos, com leveza, muitas vezes apenas para garantir que todos os discursos pudessem manifestar expressão, mesmo num momento conturbado da história nacional, exigindo, entretanto, rigor epistêmico e adesão aos princípios reitores da atividade científica no desenrolar das pesquisas e no manejar dos argumentos nas discussões infindáveis.

Mente privilegiada, espírito aberto, sempre esteve a estimular os talentos, a orientar os incautos e a apontar caminhos para os ocasionalmente despidos de direção, convocando a todos para o trabalho. Na atividade docente, Professor concorrido de Direito Administrativo, antecipou muitos temas que, depois, apareceram no quadro de disputabilidade delineado pelo processo constituinte.

O Professor Blasi é um homem contemporâneo de seu tempo, um cosmopolita que ama profundamente o que faz, tendo dedicado sua vida profissional ao Direito e à amada terra catarinense (à sua aldeia, diria Pessoa) e, por isso mesmo, ao Brasil.

Alguns homens tiveram oportunidade de mudar o mundo e o fizeram. É o caso do homenageado. Homem público, Presidente da Ordem dos Advogados do Brasil, Seção de Santa Catarina, advogado requisitado, professor querido, conferencista admirado, cidadão honorário de Florianópolis, fundador do Instituto Catarinense de Direito Administrativo e membro do brasileiro, tantos são os títulos e atributos pessoais que não seria o caso, aqui, de enumerá-los. Basta dizer que Paulo Henrique Blasi é um brasileiro exemplar.

Um modelo a iluminar, com suas virtudes, por sua tenacidade, pelos valores que pratica, a caminhada dos mais jovens, particularmente daqueles que querem conferir um sentido maior à existência e à experiência pessoal. Daí ser fácil dizer que há muito tempo seu nome encontra-se inscrito na memória jurídica nacional.

É mais do que merecida a homenagem prestada através da presente obra: Grandes temas de Direito Administrativo. O livro, uma coletânea, compõe um retrato do estado da arte da disciplina juspublicística, através do enfrentamento de temas momentosos e, muitas vezes, polêmicos que vão desde a responsabilidade subjetiva do Estado por comportamentos omissivos até o paradigma do resultado no terreno da Administração Pública.

Os estudos, escritos por alguns dos mais importantes nomes do direito público (Celso Antônio Bandeira de Mello, Rui Stocco, José dos Santos Carvalho Filho, Fernanda Marinela de Sousa Santos, Juarez Freitas, Ela Wiecko de Castilho, Sérgio Ferraz, Carlos Ari Sundfeld e Jacintho Arruda Câmara, Odete Medauar, Diogo de Figueiredo Moreira Neto, José Renato Nalini, Romeu Felipe Bacellar Filho, Adilson Dallari, Leonel Severo Rocha, Clovis Beznos e Carlos Ayres Brito), por todas as razões, mas especialmente em decorrência do prestígio de seus autores e de suas qualidades intrínsecas, são demonstração eloqüente do respeito que o homenageado granjeou entre os juristas brasileiros. Trata-se, pois, de um livro superior providenciado para homenagear um jurista maior.

Neste ponto, cumpre render cumprimentos ao Desembargador Volnei Ivo Carlin, Professor da Universidade Federal de Santa Catarina e aluno do homenageado, pela feliz iniciativa, digna de todos os elogios, e pelo modo elegante como conduziu a difícil tarefa de coordenar a empreitada.

E agradecer também esta imerecida oportunidade que me foi concedida, verdadeiro privilégio, de também prestar homenagem ao Professor Paulo Henrique Blasi de quem tive a honra ser aluno. Aliás, aluno ainda sou, porque os grandes mestres são nossos mestres para sempre.

Receba, Professor Paulo Henrique Blasi, o abraço da comunidade jurídica nacional.

De Curitiba para Florianópolis, em 10 de julho de 2008."

Clèmerson Merlin Clève

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