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A lei antimonopólios dos serviços de comunicações da Argentina e a liberdade de imprensa

Guilherme Franzen Rizzo

A maior ou menor atuação do Estado na economia sempre será objeto de estudos e debates. Afinal, não há Estado sem mercados nem mercados sem o Estado.

sábado, 16 de novembro de 2013

Atualizado em 14 de novembro de 2013 17:03

Muito se tem falado nos últimos dias sobre o julgamento da Suprema Corte Argentina que declarou constitucional a "Lei de Meios". Dita lei foi promulgada visando acabar com a concentração do mercado no setor de telecomunicações. Opiniões contrárias afirmam que seria uma maneira do Governo tolher a liberdade de expressão em nosso país vizinho.

O tema, sem dúvida alguma, é de grande relevância.

Para compreendermos a questão é preciso termos presente que economias desenvolvidas dependem de regras. Sem regras não há segurança, sem segurança não há mercados. É neste cenário que surge o papel o Estado, normatizando e regulamentando a economia. Este dever de atuação/intervenção estatal na economia se faz necessário para corrigir as falhas e garantir o acesso aos mercados - de concorrentes e consumidores - tudo pautado num ambiente de liberdade de iniciativa e liberdade de concorrência.

A concentração econômica, por si só, não é reprimível. Mas sobre ela os órgãos estatais de defesa da concorrência do mundo todo deitam muitos cuidados e atenção, visto que em mercados concentrados há maiores chances dos agentes com poder econômico controlar: os preços, o volume da demanda, o ingresso de novos competidores (impondo barreiras à entrada), o nível do desenvolvimento tecnológico e o acesso às informações. 

No caso argentino, foi criada uma lei, chamada de "Ley de Servicios de Comunicación Audiovisual", que delimitou em até 35% o controle que os grupos de telecomunicações daquele país poderão ter sobre os regimes de concessão. O art. 1° da regra argentina indica que a lei serve para desconcentrar o mercado e promover o desenvolvimento, a democratização, a universalização e o aproveitamento de novas tecnologias da informação e comunicação. A lei foi contestada pelo grupo Clarín (maior grupo de telecomunicações da Argentina) que atualmente detém 41% das concessões de rádios, 38% das concessões de televisão aberta e 59% das concessões de televisão a cabo. Com o julgamento da constitucionalidade da "Lei dos Meios", o grupo Clarín terá que se desfazer de grande parte das mais de que possui, para ficar no limite legal de 35%.

A maior ou menor atuação do Estado na economia sempre será objeto de estudos e debates. Afinal, não há Estado sem mercados nem mercados sem o Estado. O Poder Público e a iniciativa privada são interdependentes, necessitarão sempre um do outro para existir.

A Argentina como país soberano que é, tem o direito de atuar dentro de sua ordem econômica e impor os limites que suas instituições compreenderem como corretos. Se a lei foi utilizada para fins políticos, e mesmo assim aprovada por suas instituições, esse é um problema que eles precisam resolver também de forma política. O que não nos parece justo é acusar nosso vizinho de tolher a liberdade de expressão e de imprensa. A desconcentração de mídia lá estabelecida apenas desconcentrou o mercado, não censurou nenhum meio de comunicação. O grupo Clarín continuará com total liberdade de expressão e de imprensa em todas as mais de 90 concessões de serviços de telecomunicações que continuará explorando (que abarcam canal de TV, canais de TV a cabo e rádios).

Apresentamos essas considerações, pois questões de extrema relevância como a atuação do Estado na economia precisam ser analisadas de forma clara e não podem ser desvirtuadas com falsas ideias de que controles de concentração econômica implicam em censura à liberdade de expressão e de impressa. A confusão nunca faz bem para ninguém, especialmente quando se trata de informação.

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* Guilherme Franzen Rizzo é advogado do escritório Deboni, Rizzo & Sponton Advogados.


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