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Aspectos internacionais do contrato de trabalho

Ante situações nas quais haja um aparente conflito de normas ou dúvidas quanto ao câmbio aplicável no pagamento das verbas trabalhistas, que por mais inusitadas sejam as dúvidas e cada vez mais surjam novos paradigmas nas relações de trabalho, é fundamental considerar que os princípios do direito do trabalho certamente oferecem respostas criativas para comportar essas novas questões.

segunda-feira, 13 de abril de 2020

Atualizado às 14:08

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Quais as implicações jurídicas quando um contrato de trabalho, celebrado e executado no Brasil, dispõe que o salário será pago em moeda estrangeira e que as normas laborais aplicáveis serão de um ordenamento jurídico estrangeiro? Seria válida ou nula uma contratação nesses termos? Quando salário e demais parcelas recebidas são fixadas em moeda estrangeira, como deve se operar o pagamento e qual a taxa de câmbio aplicável na ocasião em que for cumprida a obrigação?

O legislativo e a Justiça do Trabalho já trataram do tema quando a contratação e prestação de serviços se operarem em mais de um ordenamento jurídico. A lei 7.064 de 1982, conhecida como Lei Mendes Júnior, aborda a situação do trabalhador cujo contrato foi celebrado no Brasil, mas executado no exterior. Procurando garantir os princípios protetivos e, considerando que, à época em que esta lei foi criada, países com legislação social menos favorável era o principal destino dos trabalhadores expatriados do Brasil, a lei 7.064/82 estabelece que a legislação brasileira sempre será o patamar mínimo aplicável ao contrato de trabalho, ainda que a prestação de serviços se dê em outro país.

Dessa forma o TST cancelou, em 2012, a súmula 207 que determinava a aplicação da lei do local da execução do trabalho, não da contratação, na medida em que tal preceito não se coaduna com o princípio da norma mais favorável, articulado com a nova dinâmica das relações laborais internacionais, em que, não raro, a contratação e a prestação de serviços se operam em mais de um ordenamento jurídico.

Feita esta breve reflexão e retomando o questionamento, não há dúvidas, portanto, quanto à nulidade de um contrato de trabalho, celebrado e executado no Brasil, que preveja a aplicação de legislação estrangeira cujos direitos sejam menos favoráveis. No entanto, nesta mesma hipótese, haveria margem para aceitar a aplicação de lei laboral estrangeira mais favorável? O princípio da norma mais favorável prevalece ou seria mitigado ante o princípio da "lex loci executionis" quando a contratação e prestação de serviços se der no Brasil? Neste caso nem mesmo se trata de uma arregimentação de trabalhador para o exterior ou repatriação, pois é evidente que todos os elementos de um contrato de trabalho brasileiro foram concretizados em território nacional, logo não seria aplicável a legislação estrangeira, tal qual o artigo 198 do Código de Bustamante estabelece ser territorial o critério para se aplicar a lei de proteção social.

Outro tema importante quanto a aspectos internacionais em um contrato de trabalho celebrado e executado no Brasil diz respeito à moeda em que for fixado o salário e o seu pagamento. Primeiramente, convém destacar que, inobstante o artigo 463 da CLT vede o pagamento de salários em moeda estrangeira, como forma de evitar desvalorizações no câmbio que a moeda nacional possa sofrer, não há vedações no ordenamento jurídico brasileiro para se fixar o salário, bem como outras parcelas remuneratórias, em moeda estrangeira. Entretanto, o pagamento deve ser feito em reais e uma vez fixado em moeda estrangeira, o câmbio do momento da contratação, no mínimo, deve ser respeitado.

Por um lado, se houver uma desvalorização da moeda estrangeira em relação ao real, o salário jamais poderá ser reduzido para um valor abaixo do patamar fixado, conforme preconiza o artigo 7º, IV da Constituição Federal que garante a irredutibilidade salarial. Por outro, se a flutuação do câmbio leva à majoração da remuneração em reais, tem-se que este valor aderiu ao contrato de trabalho, eis que o fato de o empregador fixar o salário em moeda estrangeira agrega este risco de que o real possa sofrer desvalorizações. Por isso, são devidos os acréscimos salariais decorrentes da valorização do câmbio, à medida em que os salários e demais parcelas remuneratórias forem pagas, segundo a garantia constitucional da irredutibilidade salarial e o princípio da condição mais benéfica, articulados com a regra do artigo 315 do Código Civil que prevê o cumprimento das obrigações no valor nominal e em moeda corrente na ocasião do vencimento.

Não raramente, para os ocupantes de cargos executivos, os salários, bônus, prêmios e participação nos lucros e resultados são fixados em moeda estrangeira justamente com o propósito de evitar que eventuais instabilidades econômicas no Brasil afetem o padrão remuneratório convencionado na contratação, ainda mais se tratando de altos valores.

Em conclusão, ante situações nas quais haja um aparente conflito de normas ou dúvidas quanto ao câmbio aplicável no pagamento das verbas trabalhistas, que por mais inusitadas sejam as dúvidas e cada vez mais surjam novos paradigmas nas relações de trabalho, é fundamental considerar que os princípios do direito do trabalho certamente oferecem respostas criativas para comportar essas novas questões.

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*Victoria Catalano Corrêa Guidette é advogada do escritório Cerdeira Rocha Vendite e Barbosa Advogados e Consultores Legais.

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