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Liberdade de expressão e fake news

A pergunta que precisa ser respondida é: limitar a criação e o compartilhamento de fake news seria uma violação da liberdade de expressão?

segunda-feira, 15 de junho de 2020

Atualizado às 14:26

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O debate que se tem replicado nos últimos dias em todos os veículos de comunicação sobre os limites da liberdade de expressão e as fake news (notícias falsas) é extremamente salutar e democrático.

Neste contexto, evitando juridiquês, é importante pontuar que o Direito, esse conjunto de regras e princípios que regulam a vida em sociedade e que estão repousados na Constituição Federal, nos Códigos, decretos etc., nada mais é do que uma trincheira normativa que separa o que é permitido do que é proibido.

Claro que existem situações mais extremas onde identificar o que é permitido e o que é proibido é uma tarefa simples. Há outras, contudo, que ficam bem ali na sombra da trincheira que não são facilmente identificáveis, antes o contrário. Estas, são situações que normalmente envolvem uma fake colisão de direitos por trás dos atos que se praticam.

A pergunta que precisa ser respondida é: limitar a criação e o compartilhamento de fake news seria uma violação da liberdade de expressão?

Bem, a própria noção de Direito envolve limites, pois nem tudo é permitido, e se assim não fosse seria impossível a vida em sociedade. A liberdade de expressão é, sem dúvida um dos mais sagrados e fundamentais direitos e que fique bem claro que ele não se reduz à liberdade de opinião e a manifestação do pensamento; a rigor, é muito mais que isso. Envolve, por exemplo, liberdade de exprimir sua crença, ou falta de crença, de exprimir com plenitude sua opção de gênero, etc. Aliás, o próprio sagrado direito de votar é exercício da liberdade de expressão.

Assim, na regulação das condutas das pessoas em sociedade, e na definição dos limites da trincheira que separa o que é proibido do que é permitido, o Poder Legislativo pode, a depender da importância do bem jurídico envolvido, optar por criar regras que impeçam ou removam a lesão a estes bens jurídicos. Explico.

O direito ao meio ambiente, o direito à saúde, o direito à segurança são exemplos de que a preocupação prioritária de quem legisla deve ser evitar, impedir que lesões aconteçam porque depois de violado o direito, não é possível obter uma restauração integral e completa, ou seja, remediar prejuízos é insuficiente.

No que concerne à liberdade de expressão, sob pena de atingir a própria democracia, a trincheira legislativa deve, a priori, formular regras que não cerceiem, não limitem, não abreviem, mas sim que corrijam os excessos do exercício desse sagrado direito. Neste passo, parece-nos importante observar que exigir que provedores façam filtros prévios do certo e errado é assumir um o risco de que, propositadamente ou não, existam manipulações ideológicas, seja para qual lado for afastando a neutralidade essencial da rede à liberdade de manifestação do pensamento.

Neste caso, do controle prévio por filtros estabelecidos pelos provedores, o risco de prejuízo à democracia pelo cerceamento da liberdade de expressão é maior do que o eventual prejuízo causado pelo excesso, daí porque corrigir, neste caso, é melhor do que evitar.

Como o próprio nome já diz, fake é falso, e por isso mesmo nenhuma fake news pode se ancorar em liberdade de expressão, mormente quando estas notícias têm o propósito de enganar, ludibriar ou ofender quem quer que seja.

É muito difícil impedir, em tempos de sociedade em rede, que se produzam notícias falsas que afetem a honra, a liberdade, a segurança, a imagem, a saúde, etc. de quem quer que seja, seja um ente individual ou coletivo, mas é perfeitamente possível que se puna, severamente, este tipo de comportamento que, fraudulentamente, se veste como sendo um fruto da liberdade de expressão.

Quem não se lembra que o Código Penal pune os excessos da liberdade de expressão como o crime de calúnia, difamação e injúria (arts. 138, 139 e 140)? O que é isso senão punição contra os abusos desta liberdade de expressão?

Aquele que se ancora na liberdade de exprimir-se para produzir ou compartilhar fake news que sabe ser enganosa, ofensiva, atentatória e prejudiquem direitos individuais ou coletivos pratica crime, pois expressa-se fora da trincheira do permitido. Este uso indevido e prejudicial de um direito tão sagrado deve ser severamente punido, não apenas para servir de correção do infrator individual ou da organização criminosa, mas também para ter um efeito pedagógico natural inibidor daqueles que pretendam fazer a mesma coisa.

A punição exemplar contra as fake news, removendo o ilícito e punindo os infratores é medida fundamental para a integridade do legítimo, sagrado e democrático direito de se expressar. A falsidade não está na sombra da trincheira, é só jogar luz sobre a questão.

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t*Marcelo Abelha Rodrigues é pós-doutorando em Direito Processual Universidade de Lisboa. Doutor em Direito PUC-SP. Mestre em Direito PUC-SP. Professor da Graduação e Mestrado da UFES. Advogado e Consultor Jurídico do escritório Cheim Jorge & Abelha Rodrigues Advogados Associados.

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