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Empresa não é culpada por ação truculenta da polícia em greve de trabalhadores

A 7ª turma do TST, ao negar pedido de indenização por dano moral a um boia-fria agredido por policiais militares durante manifestação de trabalhadores do campo, entende que não há ilicitude no ato de o empregador acionar a força policial para conter movimento grevista de trabalhadores em sua propriedade. Ao contrário, trata-se de exercício regular de um direito, não havendo como imputar culpa ao empresário caso a ação da polícia seja truculenta a ponto de causar danos aos empregados.

Da Redação

segunda-feira, 15 de agosto de 2011

Atualizado às 09:34


Excesso

Empresa não é culpada por ação truculenta da polícia em greve de trabalhadores

A 7ª turma do TST, ao negar pedido de indenização por dano moral a um boia-fria agredido por policiais militares durante manifestação de trabalhadores, entende que não há ilicitude no ato de o empregador acionar a força policial para conter movimento grevista de trabalhadores em sua propriedade. Ao contrário, trata-se de exercício regular de um direito, não havendo como imputar culpa ao empresário caso a ação da polícia seja truculenta a ponto de causar danos aos empregados.

Em 2008, cerca de 600 trabalhadores resolveram parar as atividades e impedir a circulação de ônibus na fazenda, com o intuito de reivindicar melhores condições de trabalho, dentre elas, refeições condizentes, pagamento correto de salários e devolução das carteiras de trabalho, retidas pelo empregador. A empresa chamou a polícia e os empregados teriam sido espancados, presos e humilhados.

Duas versões para o mesmo fato foram contadas nos autos: a do boia-fria, de que o patrão acionou a força policial sem necessidade, pois o movimento era pacífico, e a do empresário, de que pediu apoio à polícia para proteger sua propriedade, já que no mês anterior, os mesmos trabalhadores haviam ateado fogo nos alojamentos causando-lhe prejuízos. O ponto incontroverso é que a PM de GO chegou ao local desencadeando uma ação truculenta, que culminou com a prisão de alguns trabalhadores.

Insatisfeito com a forma de atuação policial, o boia-fria ajuizou reclamação trabalhista contra seu empregador, com pedido de indenização por danos morais. A vara do Trabalho de Jatai/GO aceitou o pedido e condenou a empresa a pagar R$ 4.650,00 a título de danos morais ao trabalhador. A empresa recorreu ao TRT que, ao apreciar o recurso ordinário, também entendeu pela configuração do dano, mas diminuiu o valor da condenação para R$ 1.500,00.

TST

No recurso ao Tribunal Superior, a empresa pediu a exclusão da condenação. O ministro Ives Gandra Martins Filho, relator do acórdão, aceitou o pedido da empresa. Com base na descrição dos fatos feita pelo TRT, o ministro concluiu que não houve culpa ou dolo da empresa em relação a atuação policial, tampouco de ação ou omissão ilícita que tivesse causado constrangimento ao trabalhador.

Para o relator, os fatos revelaram a necessidade de pedido de apoio policial. "A empresa tinha motivos para esperar um novo tumulto, porque já havia ocorrido uma situação de tensão um mês antes da paralisação, que consistiu em incêndio em suas dependências, tendo alguns trabalhadores sido denunciados por conduta criminosa à época. O impedimento de circulação dos ônibus demonstrou também a existência de hostilidade relativamente a bens e pessoas, configurando comportamento abusivo dos trabalhadores", destacou o ministro.

"Chamar a polícia decorreu do exercício regular de um direito, consubstanciado no acionamento de força policial para dirimir questão de segurança, sendo certo que, se houve excesso, este se deveu exclusivamente à conduta dos policiais, descabendo atribuí-lo à empresa, que, certamente, não agiu com culpa ou dolo", esclareceu o relator. O recurso foi provido para excluir a condenação por danos morais.

Veja abaixo a íntegra do acórdão.

_________

ACÓRDÃO

(7ª Turma)

IGM/tsm/ca

I) AGRAVO DE INSTRUMENTO - VIOLAÇÃO LEGAL CONFIGURADA - PROVIMENTO. Diante da possível constatação de violação ao art. 186 do CC quanto à indenização por danos morais decorrente de ação de policiais militares chamados pela empresa ao local de trabalho, que resultou em agressões generalizadas, dá-se provimento ao agravo de instrumento para determinar o processamento do recurso de revista.

Agravo de instrumento provido.

II) RECURSO DE REVISTA - INDENIZAÇÃO POR DANO MORAL - ACIONAMENTO DE FORÇA POLICIAL - EXERCÍCIO REGULAR DE DIREITO - INEXISTÊNCIA DE ATO ILÍCITO OU CULPA/DOLO DA RECLAMADA.

1. Além do enquadramento no conceito de dano moral, a lesão que pode gerar indenização na seara laboral deve ser passível de imputação ao empregador. Trata-se do estabelecimento do nexo causal entre lesão e conduta omissiva ou comissiva do empregador.

2. Na hipótese, o Regional confirmou a condenação da Reclamada ao pagamento de indenização por danos morais em decorrência de ação policial militar truculenta, por considerar que a Empresa não conseguiu demonstrar a necessidade de acionar a Polícia Militar logo no início de paralisação coletiva organizada por seus Empregados, sem ameaça a pessoas ou bens, devendo, por essa razão, assumir os riscos da atuação dos policiais em relação aos seus trabalhadores.

3. Do contexto fático delineado pela Corte de origem, não se revela viável a identificação da culpa ou dolo da Reclamada relativamente à atuação da Polícia Militar, tampouco de ação ou omissão ilícita atribuível à Empresa. Isso porque, a ação de chamar a polícia não pode ser considerada ato ilícito, na medida em que: a) a Empresa tinha motivos para esperar um novo tumulto, porque já havia ocorrido uma situação de tensão apenas um mês antes da referida paralisação, que consistiu em incêndio em suas dependências, tendo alguns trabalhadores sido denunciados por conduta criminosa à época; b) o impasse consistia em permitir ou não a circulação de ônibus, tendo sido assentado, inclusive, que tal situação se verificou tanto no interior do terreno da empresa como em área pública subjacente, o que denota a existência de hostilidade relativamente a bens e pessoas, notadamente considerando que o bloqueio na circulação de ônibus, impedindo outros de trabalharem, configura comportamento abusivo, que extrapolou os limites geográficos da Empresa.

4. Nesse contexto, chamar a polícia decorreu do exercício regular de um direito, consubstanciado no acionamento de força policial para dirimir questão de segurança, sendo certo que, se houve excesso, este se deveu exclusivamente à conduta dos policiais, descabendo atribuí-lo à Reclamada, que, certamente, não agiu com culpa ou dolo, mormente considerando a excludente de culpabilidade acima mencionada e a própria conclusão do julgador -a quo- de que os seus prepostos teriam agido para buscar a liberação dos detidos.

5. Dessa forma, a decisão regional está a merecer reforma, por violação do art. 186 do CC.

Recurso de revista parcialmente conhecido e provido.

Vistos, relatados e discutidos estes autos de Recurso de Revista n° TST-RR-1692-62.2010.5.18.0000, em que é Recorrente RIO CLARO AGROINDUSTRIAL S.A. e Recorrido JOSÉ ADRIANO DA SILVA.

RELATÓRIO

O Presidente do 18ª Regional, com base na ausência de violação dos arts. 5º, LV, e 93, IX, da CF, 333 e 458 do CPC, 818 e 832 da CLT, 186 e 927 do CC, na Orientação Jurisprudencial 115 da SBDI-1, nas Súmulas 296 e 337, I, todas do TST, e no art. 896, -a-, da CLT, denegou seguimento ao recurso de revista interposto pela Reclamada (seq. 1, págs. 703-706).

Inconformada, a Reclamada interpõe o presente agravo de instrumento, sustentando que sua revista tinha condições de prosperar (seq. 1, págs. 2-42).

Não foi apresentada contraminuta ao agravo, tampouco contrarrazões ao recurso de revista.

Dispensada a remessa dos autos ao Ministério Público do Trabalho, nos termos do art. 83, § 2º, II, do RITST.

É o relatório.

VOTO

AGRAVO DE INSTRUMENTO

I) CONHECIMENTO

O agravo de instrumento é tempestivo (seq. 1, pág. 711), regular a representação processual (seq. 1, págs. 51-54), e se encontra devidamente instrumentado, com o traslado das peças obrigatórias e essenciais exigidas pela Instrução Normativa 16/99 do TST, razão pela qual dele CONHEÇO.

MÉRITO

INDENIZAÇÃO POR DANO MORAL - AÇÃO POLICIAL

Despacho Agravado: O entendimento regional, baseado no conjunto probatório dos autos, não viola os arts. 818 da CLT, 333 do CPC, 186 e 927 do CC. Arestos oriundos do 18º Regional e de Turma do TST não se prestam ao fim colimado. Incidem relativamente a outros arestos as Súmulas 296 e 337, I, do TST (seq. 1, pág. 706).

Fundamento do Agravo: Em 19/05/08 foi realizada uma paralisação por alguns empregados, com fins reivindicatórios, a qual impediu cerca de 600 empregados de exercerem as suas tarefas, inviabilizando a saída de ônibus de obreiros para a lavoura, inclusive com a obstrução de estrada. Um mês antes desse evento os alojamentos da empresa haviam sido incendiados por alguns funcionários, o que gerou grande tumulto e grande receio na empresa.

Nesse contexto, em 19/05/08, sem conseguir resolver o impasse, a Reclamada chamou a polícia, temendo nova manifestação violenta, o que não foi bem recebido pelos manifestantes (seq. 1, págs. 21-25).

Nesse cenário, é certo que não foi praticado nenhum ato ilícito pela Empresa capaz de gerar o dano decorrente da atuação truculenta da polícia militar, sendo certo que os prepostos da Reclamada, inclusive, atuaram em favor dos empregados. Considerados os fatos narrados, o acionamento da polícia consistiu em regular exercício de um direito, para proteger o seu patrimônio e a integridade física de terceiros. É equivocado entender que a Agravante seria responsável pela ação da polícia em virtude da ocorrência dos fatos em suas dependências ou por tê-la acionado. Não restou provada a conduta ilícita, nem o dolo ou a culpa da Empresa, tampouco o efetivo dano ao Obreiro, que se valeu de narrativa genérica na tentativa de auferir benefício. A decisão regional violou os arts. 186 e 927 do CC, 818 da CLT e 333, I, do CPC e divergiu, de forma específica, de outros julgados (seq. 1, págs. 27-40).

Solução: No caso, a discussão gira em torno de pedido de indenização por dano moral por ameaças, agressões físicas e verbais e prisões, causadas por policiais militares ao Empregado no local de trabalho.

Com efeito, o dano moral constitui lesão de caráter não material ao denominado patrimônio moral do indivíduo, integrado por direitos da personalidade.

Tanto em sede constitucional (CF, art. 5º, -caput- e V, VI, IX, X, XI e XII) quanto em sede infraconstitucional (CC, arts. 11-21), os direitos da personalidade albergam basicamente os direitos à vida, integridade física, liberdade, igualdade, intimidade, vida privada, imagem, honra, segurança e propriedade, que, pelo grau de importância de que se revestem, são tidos como invioláveis.

Do rol positivado dos direitos da personalidade, alguns têm caráter preponderantemente material (vida, integridade física, liberdade, igualdade, segurança e propriedade), ainda que não necessariamente mensurável economicamente, e outros possuem caráter preponderantemente não material (intimidade, vida privada, imagem e honra). Estes últimos se encontram elencados expressamente no art. 5º, X, da CF.

Assim, o patrimônio moral, ou seja, não material do indivíduo, diz respeito aos bens de natureza espiritual da pessoa. Interpretação mais ampla do que seja dano moral para albergar todo e qualquer sofrimento psicológico careceria de base jurídico-positiva (CF, art. 5º, X), e para incluir bens de natureza material, como a vida e a integridade física, necessitaria de base lógica (conceito de patrimônio moral).

Por outro lado, além do enquadramento no conceito de dano moral, a lesão deve ser passível de imputação ao empregador. Trata-se do estabelecimento do nexo causal entre lesão e conduta omissiva ou comissiva do empregador.

Na hipótese, o Regional confirmou a condenação da Reclamada ao pagamento de indenização por danos morais em decorrência de ação policial militar truculenta, por considerar que a Empresa não conseguiu demonstrar a necessidade de acionar a Polícia Militar logo no início de paralisação coletiva organizada por seus Empregados, sem ameaça a pessoas ou bens, devendo, por essa razão, assumir os riscos da atuação dos policiais em relação aos seus trabalhadores (ameaças, agressões físicas e verbais e prisões) (seq. 1, págs. 489 e 492-506).

A Reclamada, por sua vez, defende que o acionamento da polícia constituiu exercício regular de um direito, notadamente por ter havido uma barreira impedindo a circulação dos ônibus que realizavam o transporte entre os alojamentos e o campo de serviço, inclusive com bloqueio de rua externa à sua área, e, também, por haver ocorrido um incêndio que gerou grande receio e tumulto no mês anterior (seq. 1, págs. 27-40).

Do contexto fático minuciosamente delineado pela Corte -a quo-, não se revela viável a identificação da culpa ou dolo da Reclamada relativamente à atuação da Polícia Militar, tampouco de ação ou omissão ilícita atribuível à Empresa que teria causado o constrangimento descrito pelo Regional.

Isso porque exsurge de forma suficientemente clara do acórdão regional que as alegadas ameaças, agressões (físicas e verbais) e prisões teriam partido dos policiais militares e não de prepostos da Reclamada, sendo certo que, dos fatos registrados pelo Colegiado de origem, não se confirma nenhuma atuação imprópria ou abusiva de funcionários da Empresa contra os manifestantes.

Senão vejamos: a) o pleito de indenização se fundou em danos morais que teriam sido provocados por ameaças, agressões e constrangimentos cometidos por policiais militares (seq. 1, pág. 494); b) peças que vieram do Ministério Público do Trabalho e da Justiça Estadual tratam de questão anterior, consistente em incêndio, supostamente causado por outros trabalhadores da Empresa (que não o Reclamante), sendo certo que os documentos e fotos evidenciam que houve destruição em um dos alojamentos por um incêndio no mês anterior à situação em análise nos presentes autos (seq. 1, pág. 496); c) relativamente à situação alegada na inicial (manifestação coletiva de empregados, com paralisação dos trabalhos, em 19/05/08), a polícia foi acionada pela Empresa, entrou em confronto com alguns trabalhadores e efetuou a detenção de uns poucos, em circunstâncias verificadas tanto no interior do terreno da empresa (inclusive no alojamento) como em área pública adjacente (seq. 1, pág. 504); d) não restou demonstrado que as ameaças, agressões e as prisões tenham decorrido de uma solicitação direta de nenhum preposto da Reclamada, que, ao contrário, teriam agido para buscar a liberação dos detidos (seq. 1, pág. 504).

Com efeito, considerado o cenário fático a que chegou o juízo de primeiro grau, reiterado pelo Regional, descabe cogitar de ato ilícito praticado pela Reclamada. A uma, porque as alegadas ameaças, agressões e prisões teriam partido a toda evidência da Polícia Militar e não de prepostos da Reclamada, os quais, aliás, atuaram em prol dos trabalhadores, conforme concluiu o próprio julgador singular em face da prova dos autos (seq. 1, pág. 504).

A duas, porque a ação da Reclamada de chamar a polícia não pode ser considerada ato ilícito, não se afigurando viável alcançar a mesma conclusão a que chegou o juízo monocrático, mantida pelo Regional, no sentido de que a Empresa não teria demonstrado a necessidade de acionar a força policial no início de movimento coletivo de paralisação dos trabalhos. Ora, os fatos narrados autorizam justamente conclusão diametralmente oposta, no sentido de ter a Reclamada efetivamente se valido do exercício regular de um direito, mormente considerada a sua falta de perspectiva e de obrigação de conseguir solucionar o problema, o qual extrapolou os limites geográficos da Empresa e repercutiu em área pública, conforme ressaltou o julgador -a quo-.

De fato, conforme restou consignado, ao constatar a paralisação e os acontecimentos de 19/05/08, a Empresa tinha motivos para esperar um novo tumulto, porque já havia ocorrido uma situação de tumulto, tensão e receio apenas um mês antes da referida paralisação, que consistiu em incêndio nas dependências da Empresa, tendo alguns trabalhadores sido denunciados pelo Ministério Público por conduta criminosa relativa àquela ocasião.

De outra parte, o impasse, segundo transcrito pelo Regional, consistia em permitir ou não a circulação de ônibus, tendo sido assentado, inclusive, que tal impasse ou tal situação se verificou tanto no interior do terreno da Empresa como em área pública subjacente (seq. 1, pág. 504). Ora, a tensão pode até não ter descambado para a dilapidação patrimonial ou para a agressão entre pessoas (seq. 1, pág. 505), mas, certamente, denota a existência de hostilidade relativamente a bens e pessoas, notadamente considerando que o bloqueio na circulação de ônibus, impedindo outros de trabalharem, configura comportamento abusivo, que extrapolou a esfera privada da Empresa. Reforça tal convicção trecho de depoimento em que há referência a policial (Sargento Barbosa) que teria dito que o pessoal estava bloqueando a rua, -o que já fugia da nossa alçada- (seq. 1, pág. 503). Portanto, não é possível confirmar a conclusão reiterada pelo Regional de que a situação era tensa, mas não ameaçava evoluir para um cenário pior (seq. 1, pág. 505).

Nesse contexto, chamar a polícia decorreu do exercício regular de um direito, consubstanciado no acionamento de força policial para dirimir questão de segurança, sendo certo que, se houve excesso, este se deveu exclusivamente à conduta dos policiais, descabendo atribuí-lo à Reclamada, que, certamente, não agiu com culpa ou dolo, mormente considerando a excludente de culpabilidade acima mencionada e a própria conclusão do julgador -a quo- de que os seus prepostos teriam agido para buscar a liberação dos detidos (seq. 1, pág. 504). Aliás, nem sequer foi elucidado o prejuízo que o Obreiro teria pessoalmente experimentado, porque nem o juiz de primeiro grau, tampouco o Regional esclareceram se o Autor da presente reclamatória, individualmente, foi alvo da ação truculenta da polícia.

Convém citar posicionamento adotado pela 7ª Turma desta Corte Superior em caso semelhante ao dos presentes autos, -verbis-:

-AGRAVO DE INSTRUMENTO - DANO MORAL - AUSÊNCIA DE DANO - PROVIMENTO. 1. Há de ser processado o recurso de revista quando cuida a parte de demonstrar a afronta direta pelo v. acórdão regional ao artigo 927 do CC. 2. Agravo de instrumento a que se dá provimento. RECURSO DE REVISTA - DANO MORAL - AUSÊNCIA DE DANO - PROVIMENTO. 1. De acordo com o artigo 927 do CC, a obrigação de indenizar se dá quando alguém, por ato ilícito, causar dano a outrem. 2. Na hipótese dos autos, verifica-se que a reclamada, ao acionar a polícia para proteger seu patrimônio, não atribuiu diretamente a conduta criminosa ao empregado, ou seja, não extrapolou do exercício regular de seu direito, porquanto o ato não foi negligente ou imprudente, ou excedeu os limites impostos pelo seu fim econômico ou social, pela boa-fé ou pelos bons costumes. Sendo assim, ante a inexistência de cometimento de ato ilícito por parte da reclamada, não há falar na cominação à indenização por danos morais à reclamante. 3. Recurso de revista de que se conhece e a que se dá provimento- (TST-RR-108940-89.2003.5.03.0052, Rel. Min. Caputo Bastos, 7ª Turma, DEJT de 18/12/09).

É certo que a existência do dever do empregador de reparar o constrangimento a que, supostamente, foi exposto o empregado dentro da Empresa exige alguns pressupostos, sem os quais o próprio instituto da responsabilidade, nessa seara, não pode subsistir, quais sejam, o dano experimentado pelo ofendido, a ação ou a omissão do causador, o nexo de causalidade e a culpa ou o dolo.

Nesse passo, não se encontram presentes, na espécie, os pressupostos que delineiam o dever de reparar o dano causado, quais sejam, a existência de ato ilícito atribuível à Reclamada e a sua culpa ou dolo, especialmente considerado o exercício regular de um direito. Aliás, nem mesmo o dano individualmente sofrido pelo Obreiro foi devidamente esclarecido.

Desta feita, entendo que houve violação do art. 186 do CC, razão pela qual DOU PROVIMENTO ao agravo de instrumento, passando, em seguida, à análise do recurso de revista.

B) RECURSO DE REVISTA

I) CONHECIMENTO

1)PRESSUPOSTOS GENÉRICOS

O recurso é tempestivo (seq. 1, págs. 531 e 533) e tem representação regular (seq. 1, págs. 515-516), encontrando-se devidamente preparado com custas recolhidas (seq. 1, pág. 329) e depósito recursal efetuado no valor da condenação (seq. 1, págs. 331-332).

2) PRESSUPOSTOS ESPECÍFICOS

a) PRELIMINAR DE NULIDADE DO ACORDÃO REGIONAL POR NEGATIVA DE PRESTAÇÃO JURISDICIONAL

Deixo de apreciar a preliminar em liça, valendo-me da faculdade inserta no art. 249, § 2º, do CPC, considerando que a decisão, no mérito, será favorável à Recorrente.

b) PRELIMINAR DE ILEGITIMIDADE PASSIVA -AD CAUSAM-

Tese Regional: Trata-se de questão relacionada ao mérito e como tal será tratada. Com efeito, ante a existência de relação jurídica entre as Partes, este fato se afigura suficiente para determinar a permanência da Reclamada no polo passivo da demanda, mesmo que, ao final, o Reclamante não obtenha êxito em suas pretensões (seq. 1, págs. 491-492).

Antítese Recursal: O pedido de indenização por danos morais se funda em constrangimento experimentado em face da truculência policial. Ocorre que a própria decisão reconhece que nenhum ato supostamente praticado pelos policiais decorreu de ordens de preposto da Empresa. A responsabilidade por eventuais danos não poderia ser repassada à Empresa, considerado o teor dos arts. 37, § 6º, da CF e 43 do CC. Não há permissivo legal que ampare a decisão recorrida, nos termos do art. 5º, II, da CF (seq. 1, págs. 551-553).

Síntese Decisória: A legitimidade passiva resulta do fato de o Reclamante postular a tutela jurisdicional contra a Reclamada, pretendendo que ela, e apenas ela, seja condenada. Tal circunstância é suficiente para legitimar a Rio Claro Agroindustrial S.A. a compor o polo passivo da ação.

De todo modo, ressalte-se que os arts. 43 do CC e 37, § 6º, da CF não teriam, no caso, como ser tidos por violados, pois os mencionados preceitos não tratam de legitimidade de parte, mas, sim, da responsabilidade das pessoas jurídicas de direito público pelos danos que os seus agentes causarem a terceiros. Se por um lado é certo que nada impede que constituam fundamento para uma demanda contra a Administração Pública, por outro, em nada socorre à Reclamada a sua invocação, pois não se cogita de sua violação literal -in casu-.

De outra parte, para se concluir pela violação do art. 5º, II, da CF, seria necessário verificar prévia vulneração às normas infraconstitucionais que regem a matéria. Nessa linha, a ofensa ao comando constitucional dar-se-ia por via reflexa, como asseveram o STF (Súmula 636) e o TST (OJ 97 da SBDI-2, em ação rescisória).

Logo, NÃO CONHEÇO do apelo, no particular.

c) INDENIZAÇÃO POR DANO MORAL - AÇÃO POLICIAL

Tese Regional: A sentença condenou a Reclamada a pagar indenização por danos morais (no importe de R$ 4.650,00), que teriam sido provocados por ameaças, agressões e constrangimentos cometidos por policiais militares, ao fundamento de que a Empresa não conseguiu demonstrar a necessidade de acionar a força estatal armada diante de manifestação coletiva, devendo assumir os riscos advindos de sua opção. A chegada de contingente policial como solução para uma situação que, apesar de certamente tensa, não ameaçava descambar para a dilapidação do patrimônio ou a agressão entre pessoas, serviu apenas para acirrar os ânimos na aglomeração, tendo a Empresa assumido os riscos pelas consequências.

Como o juízo de origem apreciou a questão de forma apurada, podem ser adotados os fundamentos expendidos na sentença como razões de decidir. As circunstâncias geraram para o Obreiro uma dor moral, devendo a Reclamada indenizá-lo em decorrência da ação de policiais militares chamados pela Empresa ao local de trabalho, que acarretou agressões generalizadas. Apenas deve haver reforma para reduzir o valor fixado ao importe de R$ 1.500,00 (seq. 1, págs. 492-507).

Antítese Recursal: Em 19/05/08 foi realizada uma paralisação por alguns empregados, com fins reivindicatórios, a qual impediu cerca de 600 empregados de exercerem as suas tarefas, inviabilizando a saída de ônibus de obreiros para a lavoura, inclusive com a obstrução de estrada. Sem conseguir resolver o impasse, a Reclamada chamou a polícia, temendo nova manifestação violenta, o que não foi bem recebido pelos manifestantes.

Nesse cenário, é certo que não foi praticado nenhum ato ilícito pela Empresa capaz de gerar o dano decorrente da atuação truculenta da polícia militar, sendo certo que os prepostos da Reclamada, inclusive, atuaram em favor dos empregados. Considerados os fatos narrados, o acionamento da polícia consistiu em regular exercício de um direito, para proteger o seu patrimônio e a integridade física de terceiros. É equivocado entender que a Agravante seria responsável pela ação da polícia em virtude da ocorrência dos fatos em suas dependências ou por tê-la acionado. Não restou provada a conduta ilícita, nem o dolo ou a culpa da Empresa, tampouco o efetivo dano ao Obreiro, que se valeu de narrativa genérica na tentativa de auferir benefício. A decisão regional violou os arts. 186 e 927 do CC, 818 da CLT e 333, I, do CPC e divergiu de outros julgados (seq. 1, págs. 547-550 e 553-566).

Síntese Decisória: Conforme ressaltado no exame do agravo de instrumento, a Reclamada logrou demonstrar a violação do art. 186 do CC, razão pela qual CONHEÇO do recurso de revista.

d) MULTA POR EMBARGOS DE DECLARAÇÃO PROTELATÓRIOS

Tese Regional: A oposição de embargos de declaração para fins de prequestionamento depende da existência de omissão relativamente a uma tese jurídica, o que significa que o -decisum- deve adotar posicionamento explícito sobre a controvérsia encetada, mas não torna necessária a menção expressa a dispositivo reputado violado pela parte. Nesse passo, tem-se que a Reclamada opôs os aclaratórios como sucedâneo recursal, invocando a existência de omissões inexistentes, com o manifesto propósito de protelar o andamento do feito, razão pela qual deve arcar com a multa de 1% sobre o valor da causa prevista no art. 538, parágrafo único, do CPC (seq. 1, págs. 525-530).

Antítese Recursal: Os embargos foram opostos para questionar omissões verdadeiramente existentes relativas à ilegitimidade passiva para a causa e aos arts. 186 e 927 do CC, 818 da CLT e 333, I, do CPC. O recurso foi aviado por razão de celeridade processual e não com intuito protelatório. Na hipótese de ser mantida a multa, ela deve ser calculada sobre o valor da condenação (R$ 1.500,00) e não sobre o valor da causa (R$ 30.000,00). O apelo vem calcado em violação do art. 5º, LV, da CF e em divergência jurisprudencial (seq. 1, págs. 542-547).

Síntese Decisória: O recurso de revista não merece admissibilidade, no particular, pois, consoante se observa, o acórdão regional, proferido em sede de recurso ordinário, efetivamente externou tese sobre todas as questões reputadas omissas pela Reclamada, ainda que contrariamente aos seus interesses, quais sejam, legitimidade passiva -ad causam- da Empresa para responder à demanda e configuração do seu dever de reparar o dano (seq. 1, págs. 489-507).

Reforça tal convicção o fato de o presente apelo lograr ser provido, no tocante à questão de fundo, sem que tenha havido nenhum acréscimo de fundamentação, nem tampouco nenhum esclarecimento prestado em julgamento de embargos de declaração pelo Colegiado de origem. Aliás, o dispositivo legal sobre o qual a Recorrente entendeu haver omissão regional (art. 186 do CC) constitui a senda viabilizadora do conhecimento do recurso. Assim, ante a inexistência de omissão, não se revela viável a extirpação da condenação do valor da multa por embargos de declaração protelatórios.

Ademais, o entendimento dominante no TST segue no sentido de que a imposição de multa pelo caráter manifestamente protelatório dos embargos de declaração reside no poder discricionário do juízo, exercido ao abrigo dos arts. 535 e 538, parágrafo único, do CPC. Nesse sentido temos os seguintes precedentes: TST-RR-1.187/2000-060-02-00.0, Rel. Min. Vieira de Mello Filho, 1ª Turma, DJ de 01/08/08; TST-AIRR-369/2006-012-01-40.5, Rel. Min. Simpliciano Fernandes, 2ª Turma, DJ de 20/06/08; TST-AIRR-782.762/2001.4, Rel. Min. Rosa Maria Weber, 3ª Turma, DJ de 01/08/08; TST-AIRR-817/2000-021-01-40.6, Rel. Min. Fernando Eizo Ono, 4ª Turma, DJ de 20/06/08; TST-AIRR-2.471/2001-061-02-40.5, Rel. Min. Emmanoel Pereira, 5ª Turma, DJ de 01/08/08; TST-AIRR-743/2006-051-01-40.5, Rel. Min. Aloysio Corrêa da Veiga, 6ª Turma, DJ de 30/06/08; TST-RR-461/2004-065-01-40.9, Rel. Min. Ives Gandra, 7ª Turma, DJ de 01/08/08; TST-AIRR-1.721/2001-009-01-40.2, Rel. Min. Márcio Eurico Amaro, 8ª Turma, DJ de 16/05/08. Incide, pois, sobre a revista o óbice da Súmula 333 desta Corte.

O pedido subsidiário, alusivo à imposição da multa sobre o valor da condenação e não sobre o valor da causa, além de não se encontrar amparado em nenhum dispositivo legal (Súmula 221, I, do TST) tampouco em divergência jurisprudencial, afigurando-se desfundamentado à luz do art. 896 da CLT, carece de substrato jurídico, na medida em que o art. 538, parágrafo único, do CPC é claro ao estabelecer como base de cálculo o valor da causa.

Logo, NÃO CONHEÇO do apelo, no aspecto.

MÉRITO

INDENIZAÇÃO POR DANO MORAL - AÇÃO POLICIAL

Conhecida a revista por violação do art. 186 do CC, o seu PROVIMENTO é mero corolário para, reformando o acórdão regional, no aspecto, absolver a Reclamada do pagamento da indenização por dano moral.

Prejudicada a análise do tema atinente ao valor da indenização por danos morais.

ISTO POSTO

ACORDAM os Ministros da Egrégia 7ª Turma do Tribunal Superior do Trabalho: I- por unanimidade, dar provimento ao agravo de instrumento para determinar o processamento do recurso de revista; II - por unanimidade, conhecer do recurso de revista apenas no tópico referente à indenização por dano moral, por violação do art. 186 do CC, e, no mérito, dar-lhe provimento para, reformando o acórdão regional, no aspecto, absolver a Reclamada do pagamento da mencionada indenização por dano moral. Prejudicada a análise do tema atinente ao valor da indenização por danos morais.

Brasília, 09 de agosto de 2011.

Firmado por assinatura digital (MP 2.200-2/2001)

Ives Gandra Martins Filho

Ministro Relator

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