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Decisão

Admitida decadência de revisão de benefícios previdenciários anteriores a 1997

1ª seção do STJ mudou o entendimento antes aplicado pela 3ª seção sobre o tema.

Da Redação

segunda-feira, 23 de abril de 2012

Atualizado às 17:00

A 1ª seção do STJ mudou o entendimento antes aplicado pela 3ª seção sobre o tema e admitiu a decadência decenal para revisão de benefícios previdenciários anteriores a 1997. O prazo para a ação deve ser contado a partir de 28 de junho de 1997, quando o novo prazo entrou em vigor.

Para o ministro Teori Zavascki, a situação é absolutamente idêntica à da lei de processos administrativos. Antes da lei 9.784/99, não havia o prazo de cinco anos para a administração rever seus atos, sob pena de decadência. Com a lei, criado o prazo, passou-se a contar a decadência a partir da vigência da norma e não da data do ato, de modo a não haver aplicação retroativa do prazo decadencial.

Revisão a qualquer tempo

Esse é o entendimento da Corte Especial do STJ para a lei de processos administrativos. Quanto à revisão dos benefícios previdenciários, porém, a 3ª seção havia assentado orientação de que a decadência instituída pela lei 9.528/97 (resultado de conversão da MP 1.523/97) não alcançaria as relações jurídicas estabelecidas antes de sua edição. Os benefícios concedidos antes de 28 de junho de 97, portanto, estariam imunes a qualquer prazo decadencial, podendo ser revisados a qualquer tempo.

No entanto, em 5 de dezembro de 2011, a competência para matérias previdenciárias passou à 1ª seção do STJ, que interpretou a norma de modo diverso. "O entendimento da Corte Especial (que, ademais, foi adotado também pelos outros órgãos fracionários do STJ) deve ser mantido e, pelos seus próprios fundamentos, adotado na situação agora em exame", afirmou o relator.

Efeitos retroativos

Segundo seu voto, não se admitiria que o legislador inovasse para atribuir efeitos retroativos a normas quanto a prazos decadenciais, o que significaria impedir a possibilidade de exercício do direito e, na prática, a eliminação do próprio direito.

"Todavia, isso não significa que o legislador esteja impedido de modificar o sistema normativo em relação ao futuro, até porque, conforme de comum sabença, não há direito adquirido à manutenção de regime jurídico", ponderou o ministro Zavascki.

"Se antes da modificação normativa podia o segurado promover a qualquer tempo o pedido de revisão dos atos concessivos do benefício previdenciário, é certo afirmar que a norma superveniente não poderá incidir sobre o tempo passado, de modo a impedir a revisão; mas também é certo afirmar que a nova disposição legal está apta a incidir sobre o tempo futuro, a contar de sua vigência", explicou.

Decadência

No caso concreto, o benefício mais recente datava de 1994. A ação, porém, só foi tentada em 2008. O fundamento era ação trabalhista que reconheceu direito a adicional de periculosidade em favor do autor, o que implicava, segundo sua pretensão, mudança no salário de contribuição e novo cálculo do benefício; essa decisão, porém, transitara em julgado em 1986. Em qualquer caso, apontou o ministro, a decadência teria operado.

Veja a íntegra do acórdão.

_____________

RECURSO ESPECIAL Nº 1.303.988 - PE (2012/0027526-0)

RELATOR: MINISTRO TEORI ALBINO ZAVASCKI

RECORRENTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS

PROCURADOR: PROCURADORIA-GERAL FEDERAL - PGF

RECORRIDO: A.H.P. E OUTROS

ADVOGADO: MARIA LÚCIA SOARES DE ALBUQUERQUE E OUTRO(S)

EMENTA

PREVIDÊNCIA SOCIAL. REVISÃO DO ATO DE CONCESSÃO DE BENEFÍCIO PREVIDENCIÁRIO. DECADÊNCIA. PRAZO. ART. 103 DA LEI 8.213/91. BENEFÍCIOS ANTERIORES. DIREITO INTERTEMPORAL.

1. Até o advento da MP 1.523-9/1997 (convertida na Lei 9.528/97), não havia previsão normativa de prazo de decadência do direito ou da ação de revisão do ato concessivo de benefício previdenciário. Todavia, com a nova redação, dada pela referida Medida Provisória, ao art. 103 da Lei 8.213/91 (Lei de Benefícios da Previdência Social), ficou estabelecido que "É de dez anos o prazo de decadência de todo e qualquer direito ou ação do segurado ou beneficiário para a revisão do ato de concessão de benefício, a contar do dia primeiro do mês seguinte ao do recebimento da primeira prestação ou, quando for o caso, do dia em que tomar conhecimento da decisão indeferitória definitiva no âmbito administrativo".

2. Essa disposição normativa não pode ter eficácia retroativa para incidir sobre o tempo transcorrido antes de sua vigência. Assim, relativamente aos benefícios anteriormente concedidos, o termo inicial do prazo de decadência do direito ou da ação visando à sua revisão tem como termo inicial a data em que entrou em vigor a norma fixando o referido prazo decenal (28/06/1997). Precedentes da Corte Especial em situação análoga (v.g.: MS 9.112/DF Min. Eliana Calmon, DJ 14/11/2005; MS 9.115, Min. César Rocha (DJ de 07/08/06, MS 11123, Min. Gilson Dipp, DJ de 05/02/07, MS 9092, Min. Paulo Gallotti, DJ de 06/09/06, MS (AgRg) 9034, Min. Félix Ficher, DL 28/08/06).

3. Recurso especial provido.

ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia PRIMEIRA SEÇÃO do Superior Tribunal de Justiça, por unanimidade, dar provimento ao recurso especial, nos termos do voto do Sr. Ministro Relator. Os Srs. Ministros Humberto Martins, Herman Benjamin, Napoleão Nunes Maia Filho, Mauro Campbell Marques, Benedito Gonçalves, Cesar Asfor Rocha e Francisco Falcão votaram com o Sr. Ministro Relator.

Licenciado o Sr. Ministro Arnaldo Esteves Lima.

Compareceu à sessão a Dra. LUYSIEN COELHO MARQUES SILVEIRA, pelo INSS.

Brasília, 14 de março de 2012

MINISTRO TEORI ALBINO ZAVASCKI

Relator

RELATÓRIO

O EXMO. SR. MINISTRO TEORI ALBINO ZAVASCKI:

Trata-se de recurso especial interposto contra acórdão do Tribunal Regional Federal da 5ª Região em demanda objetivando a revisão da renda mensal inicial de benefícios de aposentadoria, com a inclusão dos valores referentes a adicional de risco assegurado por decisão da Justiça do Trabalho. Quanto à decadência do direito de pedir a revisão, o Tribunal de origem proferiu acórdão com a seguinte ementa:

PREVIDENCIÁRIO E PROCESSUAL CIVIL. EMBARGOS DECLARATÓRIOS. DIFERENÇAS SALARIAIS RECONHECIDAS POR SENTENÇA TRABALHISTA. REVISÃO DE APOSENTADORIA. DECADÊNCIA DO DIREITO DE PEDIR A REVISÃO. INOCORRÊNCIA. ART. 103, DA LEI 8.213/91, COM REDAÇÃO DADA PELA LEI 10.839/04. EMBARGOS CONHECIDOS E PROVIDOS, PARA SANAR A OMISSÃO APONTADA, SEM ATRIBUIÇÃO DE EFEITOS INFRINGENTES.

1. O prazo de decadência previsto no art. 103, da Lei 8.213/91, com redação dada pela Lei 10.839/04, não incide sobre pedido de revisão de benefício deferido antes de sua vigência. Hipótese em que as aposentadorias dos demandantes foram deferidas antes da vigência da Lei 10.839/04. Precedente: AC 476320/PE; Terceira Turma; Desembargador Federal Vladimir Carvalho; data julgamento 01/10/2009.

2. Embargos de declaração conhecidos e providos, para sanar a omissão apontada, porém, sem atribuição de efeitos infringentes ao acórdão embargado. (fl. 350)

No recurso especial (fls. 354/362), o recorrente aponta ofensa ao art. 103 da Lei 8.213/91, com redação dada pela MP 1.523/97, convertida na Lei 9.528/97, sustentando que "no que tange aos benefícios concedidos antes da edição da MP 1.523-9/1997, isto é, antes de 28 de junho de 1997, impõe-se a contagem de prazo decadencial decenal, utilizando-se como termo a quo o primeiro dia do mês subseqüente ao do recebimento da primeira prestação posterior à publicação da MP, ou seja, a partir do dia 1º de agosto de 1997" (fl. 360). Contra-razões às fls. 368/399, em que os recorridos pedem a manutenção do julgado, à consideração de que a MP 1.523-9/1997 não pode ter efeito retroativo.

Na sessão de 16/02/2011, a 1ª Turma desta Corte, em questão de ordem, decidiu afetar o julgamento do recurso à 1ª Seção, com base no art. 14, II, do RISTJ, em razão da relevância da matéria discutida e da necessidade de prevenir divergência entre as Turmas

É o relatório.

VOTO

O EXMO. SR. MINISTRO TEORI ALBINO ZAVASCKI (Relator):

1. Para adequada compreensão da controvérsia é importante a resenha história da evolução legislativa sobre o tema. Até o advento da MP 1.523-9/97, convertida na Lei 9.528/97, não havia previsão normativa estabelecendo prazo de decadência para o pedido de revisão de benefício previdenciário que, portanto, podia ser postulada a qualquer tempo. Por força daquela Medida Provisória, com vigência a partir de 28/06/1997, foi dada nova redação ao art. 103 da Lei 8.213/91 (Lei de Benefícios da Previdência Social), que fixou o prazo decadencial de 10 anos, nos seguintes termos:

Art. 103. É de dez anos o prazo de decadência de todo e qualquer direito ou ação do segurado ou beneficiário para a revisão do ato de concessão de benefício, a contar do dia primeiro do mês seguinte ao do recebimento da primeira prestação ou, quando for o caso, do dia em que tomar conhecimento da decisão indeferitória definitiva no âmbito administrativo. (Redação dada pela Lei nº 9.528, de 1997)

O prazo decadencial foi reduzido de dez para cinco anos, pela MP 1.663-15/98, convertida na Lei 9.711, de 20.11.98, a saber:

Art. 103. É de cinco anos o prazo de decadência de todo e qualquer direito ou ação do segurado ou beneficiário para a revisão do ato de concessão de benefício, a contar do dia primeiro do mês seguinte ao do recebimento da primeira prestação ou, quando for o caso, do dia em que tomar conhecimento da decisão indeferitória definitiva no âmbito administrativo. (Redação dada pela Lei nº 9.711, de 20.11.98)

O prazo, entretanto, foi novamente ampliado para 10 anos pela MP 138/2003, com vigência a partir de 20.11.2003, convertida na Lei 10.839/04, passando o art. 103 a ter a seguinte redação, ainda em vigor:

Art. 103. É de dez anos o prazo de decadência de todo e qualquer direito ou ação do segurado ou beneficiário para a revisão do ato de concessão de benefício, a contar do dia primeiro do mês seguinte ao do recebimento da primeira prestação ou, quando for o caso, do dia em que tomar conhecimento da decisão indeferitória definitiva no âmbito administrativo. (Redação dada pela Lei nº 10.839, de 2004)

Parágrafo único. Prescreve em cinco anos, a contar da data em que deveriam ter sido pagas, toda e qualquer ação para haver prestações vencidas ou quaisquer restituições ou diferenças devidas pela Previdência Social, salvo o direito dos menores, incapazes e ausentes, na forma do Código Civil. (Incluído pela Lei nº 9.528, de 1997)

A exposição de motivos dessa Medida Provisória 138/2003, dirigida por Ministros de Estado ao Presidente da República, que a adotou, relata essas intermitências:

Excelentíssimo Senhor Presidente da República,

Submetemos à apreciação de Vossa Excelência proposta de edição de Medida Provisória que tem por finalidade alterar dispositivos das Leis nº 8.213, de 24 de julho de 1991, a fim de ampliar prazos para a produção de efeitos do instituto da decadência por elas disciplinado e atender, de modo imediato e com maior adequação, ao interesse público no que se refere à aplicação do instituto da decadência, relativamente a direitos previdenciários.

Trata-se de questão que, embora há muito venha reclamando reexame por parte do Poder Público, revela-se urgente à medida que se aproxima o início da eficácia plena de dispositivos que introduziram inovações na matéria cujos efeitos serão prejudiciais tanto aos cidadãos quanto à própria Administração.

No que se refere ao art. 103 da Lei nº 8.213, de 1991, a Medida Provisória nº 1.523-9, de 27 de junho de 1997, inovou o direito previdenciário ao alterar esse dispositivo da Lei de Benefícios para instituir o prazo decadencial de dez anos para todo e qualquer direito ou ação do segurado ou beneficiário para a revisão do ato de concessão de benefício, a contar do dia primeiro do mês seguinte ao do recebimento da primeira prestação ou, quando for o caso, do dia em que o segurado tomar conhecimento da decisão indeferitória definitiva no âmbito administrativo. No entanto, a Medida Provisória nº 1.663-15, de 22 de outubro de 1998, convertida na Lei nº 9.711, de 20 de novembro de 1998, alterou novamente o dispositivo, para fixar em cinco anos o prazo decadencial.

A inovação mostrou-se necessária à medida que a própria Administração deve seguir prazos para promover a revisão de seus atos, não sendo, portanto, adequado que inexistisse qualquer limitação à revisão de atos provocada pelo interessado. No entanto, houve excesso por parte do legislador, ao unificar os prazos dos institutos da decadência e da prescrição.

No atual momento, o problema se acentua, em face da proximidade do vencimento do prazo decadencial ora em vigor que tem levado milhares de cidadãos a procurar as agências da Previdência Social e órgãos do Poder Judiciário, notadamente dos Juizados Especiais Federais. Há, por parte da sociedade em geral, em todo o país, clamor quanto aos efeitos que decorrerão da manutenção do prazo decadencial ora previsto, que atingiria milhares de cidadãos, os quais, por não terem oportunamente exercido seu direito de pleitear a revisão, por desconhecimento ou falta de acesso à Justiça e à Previdência seriam impedidos de fazê-lo posteriormente. Agrava o fato a circunstância de que em algumas localidades importantes, como é o caso do Estado do Rio de Janeiro, o último dia do prazo que vinha sendo noticiado pelo meios de comunicação será feriado local (dia 20 de novembro).

Cumpre, todavia, esclarecer que o prazo decadencial, nos termos do próprio artigo 103 da Lei nº 8.213, de 1991, não se completa, para todos os segurados, em 20 de novembro de 2003, mas em cinco anos a contar da data em que o segurado tomou conhecimento de decisão indeferitória definitiva, no âmbito administrativo, ou a contar do dia primeiro do mês seguinte ao do recebimento da primeira prestação. Vale dizer, portanto, que para a esmagadora maioria, o termo final se daria, mantida a atual legislação, a partir de 1º de dezembro de 2003, como já tem alertado o próprio Instituto Nacional do Seguro Social - INSS, aos segurados.

Há que se registrar, contudo, que as inúmeras modificações ocorridas ao longo dos últimos anos na legislação previdenciária têm exigido grande esforço do Poder Judiciário e dos próprios segurados, no sentido de aquilatar a extensão de seus eventuais direitos. Tal situação tem gerado muitas demandas, as quais, na vigência do atual prazo, tendem a multiplicar - pela simples pressão de que haveria uma decadência do direito de revisão - a formulação de pedidos no exíguo prazo que estaria por findar. (...)

2.Ocorre que as Turmas que compõem a 3ª Seção, competentes para julgar a matéria até o advento da Emenda Regimental 14, de 05 de dezembro de 2011, firmaram orientação "no sentido de que o prazo decadencial previsto no art. 103 da Lei 8.213/91, com a alteração trazida pela MP 1.523/97, que resultou na Lei nº 9.528/97, não atinge as relações jurídicas constituídas anteriormente" (AgRg no Ag 1361946/PR, 6ª T., Min. Maria Thereza de Assis Moura, DJe 28/09/2011), as quais, portanto, continuariam, mesmo depois da nova norma, imunes a qualquer prazo decadencial, podendo ser revisadas a qualquer tempo. Todavia, não há como dar guarida a esse entendimento, que é incompatível com a orientação da Corte Especial sobre a questão de direito intertemporal em casos semelhantes. Veja-se.

3.Conforme se depreende da resenha histórica acima desenvolvida, a instituição de prazo decadencial para a revisão de benefício previdenciário, prevista no art. 103 da Lei 8.213/91 (redação atual da Lei 10.839/04), é absolutamente idêntica a do art. 54 da Lei 9.784/99, que instituiu o prazo de decadência de cinco anos para a Administração rever seus atos. Nos dois casos, não havia, antes das respectivas leis instituidoras, prazo algum de decadência; depois, passou a haver, num caso de 10 anos, no outro, de 05 anos. Nos dois casos, a pergunta que centralizou o cerne da controvérsia é a mesma, a saber: o prazo de decadência, fixado pela lei nova, se aplica à revisão de atos da Administração praticados em data anterior à sua vigência?

Pois bem, no julgamento do MS 9.112/DF (Min. Eliana Calmon, DJ 14/11/2005), a Corte Especial, ao apreciar o tema pela primeira vez, a propósito do art. 54 da Lei 9.784/99, assentou o entendimento de que a Lei nova se aplica, sim, a atos anteriores, mas, relativamente a eles, o prazo decadencial conta-se a partir da sua vigência (e não da data do ato, porque aí, sim, haveria aplicação retroativa). Eis o que, a propósito, afirmou a Ministra relatora em seu voto:

Ora, até 1999, data da Lei 9.784, a Administração podia rever os seus atos, a qualquer tempo (art. 114 da Lei 8.112/90). Ao advento da lei nova, que estabeleceu o prazo de cinco anos, observadas as ressalvas constitucionais do ato jurídico perfeito, do direito adquirido e da coisa julgada (art. 5º, XXXVI, CF), a incidência é contada dos cinco anos a partir de janeiro de 1999. Afinal, a lei veio para normatizar o futuro e não o passado. Assim, quanto aos atos anteriores à lei, o prazo decadencial de cinco anos tem por termo a quo a data da vigência da lei, e não a data do ato.

Essa orientação foi ratificada em inúmeros outros julgados da Corte Especial, como, v.g., MS 9.115, Min. César Rocha (DJ de 07/08/06, MS 11123, Min. Gilson Dipp, DJ de 05/02/07, MS 9092, Min. Paulo Gallotti, DJ de 06/09/06, MS (AgRg) 9034, Min. Félix Ficher, DL 28/08/06, este com a seguinte ementa:

AGRAVO REGIMENTAL. MANDADO DE SEGURANÇA. ATO DO MINISTRO PRESIDENTE DO CONSELHO DA JUSTIÇA FEDERAL. VANTAGEM FUNCIONAL. ATO ADMINISTRATIVO. REVOGAÇÃO. AUTOTUTELA DA ADMINISTRAÇÃO. POSSIBILIDADE. LEI N.° 9.784/99. IRRETROATIVIDADE. DECADÊNCIA. INOCORRÊNCIA. AUSÊNCIA DE DIREITO LÍQUIDO E CERTO. PRECEDENTES DA CORTE ESPECIAL.

I - Anteriormente à edição da Lei nº 9.784/99, esta Corte tinha o entendimento de que a Administração poderia rever seus próprios atos a qualquer tempo, desde que eivados de ilegalidade e ressalvados o ato jurídico perfeito, o direito adquirido e a coisa julgada (art. 5º, XXXVI, CF).

II - Após a Lei nº 9.784/99, passou-se a entender que a administração tem o prazo de cinco anos para anular atos administrativos ilegais, inclusive os anteriores à sua vigência e que ainda permanecem irradiando seus efeitos, sendo que tal prazo deve ser contado a partir da sua entrada em vigor, ou seja 1º.02.99. Precedentes da Corte Especial (MS nºs 9.112/DF, 9.115/DF e 9.157/DF).

III - In casu, o ato que beneficiou os impetrantes (decisão unânime do Conselho de Administração do STJ, no PA 103 de 1997) foi revisto pela decisão administrativa proferida no Processo Administrativo nº 2001.160598/CJF em sessão realizada em 10/02/2003. Portanto, dentro do quinquênio decadencial, pois tal prazo não se aplica de forma retroativa e, portanto, conta-se a partir de 1º de fevereiro de 1999, data da publicação da Lei 9.784/99.

Agravo regimental desprovido.

O entendimento da Corte Especial (que, ademais, foi adotado também pelos demais órgãos fracionários do STJ) deve ser mantido e, pelos seus próprios fundamento, adotado na situação agora em exame.Ninguém questiona que seria incompatível com a Constituição, por ofensa ao seu art. 5º, XXXVI, atribuir efeito retroativo a normas que fixam prazo decadencial. Também nesse domínio jurídico não se pode conferir eficácia atual a fato ocorrido no passado. No que se refere especificamente a prazos decadenciais (ou seja, prazos para exercício do direito, sob pena de caducidade), admitir-se a aplicação do novo regime normativo sobre período de tempo já passado significaria, na prática, permitir que o legislador eliminasse, com efeito retroativo, a possibilidade de exercício do direito. Ora, eliminar, com eficácia retroativa, a possibilidade de exercício do direito é o mesmo que eliminar o próprio direito.

Todavia, isso não significa que o legislador esteja impedido de modificar o sistema normativo em relação ao futuro, até porque, conforme de comum sabença, não há direito adquirido à manutenção de regime jurídico. É nessa perspectiva que, a exemplo do que fez a Corte Especial em relação ao artigo 54 da Lei 9.784, de 1999, deve ser interpretado e aplicado o art. 103 da Lei 8.213/91, com a redação que recebeu a partir da MP 1.523-9/97 e que resultou na conferida pela Lei 10.839/04. Com efeito, se antes da modificação normativa podia o segurado promover a qualquer tempo o pedido de revisão dos atos concessivos do benefício previdenciário, é certo afirmar que a norma superveniente não poderá incidir sobre o tempo passado, de modo a impedir a revisão; mas também é certo afirmar que a nova disposição legal está apta a incidir sobre o tempo futuro, a contar de sua vigência. Portanto, a solução para o problema de direito intertemporal aqui posto só pode ser aquela dada pela Corte Especial na situação análoga: relativamente aos benefícios previdenciários anteriores à nova lei, o prazo decadencial para sua revisão tem como termo inicial o da vigência da superveniente norma, que o estabeleceu.

Esse modo de enfrentar a questão de direito intertemporal em situações da espécie é chancelado por abalizada doutrina. É o caso, por exemplo, de Galeno Lacerda, a propósito da redução do prazo decadencial da ação rescisória operada pelo CPC/73 (Novo Direito Processual Civil e os Feitos Pendentes, Forense, 1974, pp. 100-101) e de Câmara Leal, em seu clássico Da Prescrição e da Decadência (Forense, 1978, p.90). É nesse sentido também a orientação que se colhe de já antiga jurisprudência do STF:

"Prescrição Extintiva. Lei nova que lhe reduz prazo. Aplica-se à prescrição em curso, mas contando-se o novo prazo a partir da nova lei. Só se aplicará a lei antiga, se o seu prazo se consumar antes que se complete o prazo maior da lei nova, contado da vigência desta, pois seria absurdo que, visando a lei nova reduzir o prazo, chegasse a resultado oponto, de ampliá-lo" (RE 37.223, Min. Luiz Gallotti, julgado em 10.07.58).

"Ação Rescisória. Decadência. Direito Intertemporal. Se o restante do prazo de decadência fixado na lei anterior for superior ao novo prazo estabelecido pela lei nova, despreza-se o período já transcorrido, para levar-se em conta, exclusivamente, o prazo da lei nova, a partir do início da sua vigência" (AR 905/DF, Min. Moreira Alves, DJ de 28.04.78).

No mesmo sentido: RE 93.110/RJ, Min. Xavier de Albuquerque, julgado em 05.11.80; AR 1.025-6/PR, Min. Xavier de Albuquerque, DJ de 13.03.81.

4.À luz dessa orientação, examine-se o prazo de decadência fixado no art. 103 da Lei 8.213/91, relativamente aos atos anteriormente praticados pela Administração da Previdência Social. Conforme se extrai da evolução legislativa ao início apresentada, não havia, até 28/06/1997, qualquer prazo decadencial para o pedido de revisão do ato concessivo de benefício previdenciário. A partir de então, com a entrada em vigor da MP 1.523-9/1997, que deu nova redação ao citado art. 103, foi instituído o prazo decadencial de 10 anos, até hoje mantido, cumprindo observar que, conforme se depreende da exposição de motivos da MP 138/2003, acima transcrita, o prazo de cinco anos não chegou, na prática, a se efetivar, eis que atempadamente prorrogado. Portanto, seguindo a orientação adotada pela Corte Especial em situação análoga, é de se concluir que, em relação aos benefícios previdenciários anteriores a MP 1.523-9/1997, o prazo decadencial para o pedido de revisão, de dez anos, teve início na data de vigência dessa Medida Provisória, ou seja, 28/06/1997.

5.No caso dos autos, os benefícios foram concedidos antes do advento da MP 1.523-9/1997, sendo o mais recente de setembro de 1994 (fls. 06). Já a presente ação, visando à sua revisão, somente veio a ser ajuizada em 02/05/08, quando, portanto, já configurada a decadência. Registre-se que o fundamento invocado para pedir a revisão foi o reconhecimento, pela Justiça do Trabalho, do direito à percepção de adicional de risco/periculosidade, o que, no entender do segurado, demandaria alteração também de seu salário-de-contribuição e, consequentemente, do cálculo do benefício de aposentadoria. Mesmo que se considerasse esse novo evento como parâmetro de aferição, é certo que, ainda assim, a decadência estaria configurada, eis que a sentença trabalhista transitou em julgado em 19/05/1986 (fl. 108 e-STJ).

6.Ante o exposto, dou provimento ao recurso especial para julgar improcedente o pedido (CPC, art. 269, IV), invertidos os ônus sucumbenciais definidos na sentença, assegurados aos demandantes os benefícios da assistência judiciária. É o voto.

Brasília, 14 de março de 2012

MINISTRO TEORI ALBINO ZAVASCKI

Relator