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Contrato

Condição financeira de concordatária justifica a mudança de foro eleito em contrato

Alteração é permitida caso não haja prejuízo para a outra parte.

Da Redação

segunda-feira, 18 de junho de 2012

Atualizado às 15:32

A 3ª turma do STJ negou provimento a recurso da Caixa Econômica Federal e decidiu que condição financeira de empresa concordatária justifica a mudança de foro eleito em contrato desde que não haja prejuízo para a outra parte. A instituição financeira pretendia reverter julgado do TRF da 4ª região, que manteve a Justiça Federal de Curitiba como competente para julgar ação por danos morais e materiais movida contra ela por empresa de engenharia.

De acordo com o processo, a empresa firmou contrato de R$ 3,2 milhões com a Caixa em 2003 para a construção de blocos de apartamentos pelo PAR - Programa de Arrendamento Residencial. No entanto, a empresa alegou a insustentabilidade do projeto pelo preço pactuado devido a necessidades não previstas, como reforço estrutural na área da construção.

A CEF não reviu o valor do contrato nem ressarciu a empresa das despesas extraordinárias, o que a levou a pedir concordata preventiva em Curitiba. A construtora, então, ajuizou ação de reparação por danos materiais e compensação por danos morais sob alegação de que sua derrocada financeira teria sido causada pela instituição.

A Caixa suscitou incompetência do órgão julgador curitibano e alegou que, como os imóveis seriam construídos em Belém do Pará, lá deveriam ser processadas eventuais ações, o que estaria previsto no contrato e também seria determinado pelo artigo 95 do CPC, que prevê que a competência para julgar ações tratando de direito real sobre imóveis é do foro no qual eles se situam. O TRF acolheu recurso da empresa de engenharia e manteve a competência da Vara Federal de Curitiba.

O Tribunal Regional considerou que a cláusula do contrato que estabeleceu o foro em Belém teria vícios e apontou que a mudança de foro para Curitiba não traria prejuízo para a CEF, já que ela tem representação legal nas duas cidades.

A instituição financeira interpôs recurso ao STJ, insistindo na tese de desrespeito ao artigo 95 do CPC, alegando ainda violação do artigo 111 do CPC, que define que a competência é inderrogável por convenção das partes, e do artigo 3º do CDC que define obrigações de fornecedores de bens e serviços. Afirmou que a alegada hipossuficiência deveria ser aferida no momento da contratação e não justificaria a invalidação de cláusula de eleição.

A relatora do processo, ministra Nancy Andrighi, apontou que o STJ aceita excepcionalmente que o CDC seja aplicado em favor de pessoas jurídicas quando há típica relação de consumo, circunstância, contudo, que não ocorre na hipótese. A CEF não atuou como banco visando lucro, mas como agente público gerindo o PAR e estimulando a construção de moradias populares.

Quanto ao artigo 95 do CPC, a ministra entendeu que a ação não trata de direito real sobre imóveis. "Não se discute nenhuma questão relacionada à matéria disciplinada pelo direito real, tal como ocorre nas ações possessórias", esclareceu. "O que se discute na presente demanda são os supostos prejuízos sofridos pela empresa recorrida em razão da quebra contratual", afirmou a ministra no voto.

Com relação à hipossuficiência, a ministra salientou que a eleição de foro em contrato é válida, salvo se a parte não tinha conhecimento suficiente das consequências, se inviabilizar ou dificultar o acesso ao Judiciário ou se for contrato de obrigatória adesão para fornecimento de produto ou serviço exclusivo por determinada empresa. O TRF da 4ª região reconheceu que o contrato era de adesão e que a empresa de engenharia seria hipossuficiente.

Nancy afirmou que tão somente o porte da CEF não torna a parte adversa vulnerável e hipossuficiente. A condição de concordatária, todavia, demonstra a dificuldade de acesso ao Judiciário da empresa recorrida, economicamente fragilizada. Destacou, ademais, que não haveria prejuízo à CEF, conforme observado pelo TRF, considerando sua abrangência nacional.

Acompanharam o voto da relatora os ministros Massami Uyeda e Paulo de Tarso Sanseverino, ficando vencidos os ministros Sidnei Beneti e Villas Bôas Cueva.